Vanda Maria Jacinto – Árvore de Natal

Vanda Maria Jacinto – Árvore de Natal

O mês de dezembro era um mês muito especial e esperado por ela. Além de representar oficialmente o início das férias era, também, o mês do seu aniversário e o do menino Jesus.

Adorava o natal, não porque ganhasse presentes, mas por ser um período festivo, motivo de pratos mais elaborados e fartos, com direito a “sangria” e tudo mais.

Geralmente, nessas ocasiões, os parentes se reuniam na sua casa, pois sua mãe, dentre as muitas qualidades que lhe eram natas, era também uma cozinheira de mão cheia! Tudo ficava mais saboroso, quando preparado por ela…

Naquela manhã, cuidara rapidamente das obrigações diárias, com intuito de sobrar um tempinho para as brincadeiras.

E lá estava ela no quintal, debaixo do pé de limão, brincando de casinha.  Fazer comidinha nas suas panelinhas –  colher medida –, que vinha nas latas de leite em pó, era o seu brinquedo favorito.

Conversava sozinha, pois esse era, sem dúvida, um costume que levaria por toda a sua vida. No momento, discutia o cardápio do dia, quando ouviu o seu nome ser gritado pela amiga Elizabethe – filha de uma vizinha.

Brincar sozinha era possível, mas ter uma amiga para brincar, era muito melhor.

Correu ao portão, e a fez entrar. Mas antes que mostrasse a comidinha que estava a fazer, a amiga foi logo perguntando se queria ir com ela e a mãe comprar a árvore de natal.

Com certeza gostaria de ir, mas era preciso o consentimento da mãe.

Foi ligeira até o quartinho onde a mãe entretida costurava. Já chegou traquinando. Levantou uma fileira de golas de pijamas, que parecia mais um fio de bandeirolas de festa junina, ao mesmo tempo em que pedia a mãe para ir com a amiga.

Após os costumeiros questionamentos e alerta, como: onde é esse local? Vão demorar-se? Quem vai com vocês? Se der trabalho, não vai mais!

Finalmente o “sim”.

Com um sorriso de orelha a orelha saiu em disparada, sem nem se lembrar das panelas que deixou no fogo, lá embaixo do limoeiro.

Saíram as duas, pinoteando como cabritinhas novas.

Chegando ao local de vendas ficou extasiada com tantas árvores deitadas ao solo.

Naquele tempo as “árvores de natal” eram de verdade!

No local de vendas elas ficavam expostas no chão por ordem de tamanho. Tinha para todos os gostos e bolso.

Dona Josefa, a mãe de Elizabethe, comprou uma bem grande –  hoje ela sabe que era de mais ou menos dois metros de altura. Até para carregar era difícil. Foi preciso um entregador.

Enquanto dona Josefa negociava o preço e o transporte da mesma, elas brincavam nos corredores que se formavam com a disposição das árvores.

De repente parou próxima de uma árvore enorme. Ficou parada, imaginando como ficaria linda aquela árvore toda enfeitada com bolas coloridas, festão e algodão nos galhos… porque natal tinha que ter neve!

Tão absorta estava em seus devaneios que nem se deu conta que a amiga a chamava.

No caminho de volta para casa pediu para a amiga dividir com ela o prazer de montar a árvore.

Ouvindo a conversa, dona Josefa bondosamente sorriu, e disse que podia sim, ajudá-la a montar a árvore.

Chegando em casa, mal falou com a mãe, e desembestou para a casa da amiga.

Sob os cuidados de dona Josefa, pois as bolas de natal daquele tempo eram de uma delicadeza danada! Feitas de um vidro finíssimo e pintadas a mão, quebravam-se a qualquer descuido…assim foram montando a árvore!

Terminado o trabalho ficou ali admirando, maravilhada, tamanha beleza! Aos olhos daquela menina franzina e sonhadora, a árvore parecia maior ainda.

Só ficou faltando o algodão, alertou, mas dona Josefa sorriu mais uma vez e explicou que, só em alguns lugares do mundo nevava. Ali não, portanto não precisava colocar o algodão.

Desapontada, viu que era hora de voltar para casa. Se despediu e saiu pensativa. No caminho vinha matutando…o dia que eu tiver a minha árvore, eu vou colocar algodão. Natal sem neve não é natal.

O resto do dia passou normalmente. Almoçou, lavou a louça, deu uma arrumadinha na casa, ajudou a mãe nas costuras – virando as golas e punhos do lado direito.

Estranhando a quietude da filha, dona Jandira perguntou se algo estava errado… pois parecia que ela estava no mundo da lua…

Embora afirmasse o contrário, na verdade o seu pensamento estava totalmente voltado para aquela árvore de natal. Lógico que isso não era normal, mas não tinha como falar para a sua mãe do seu desejo de possuir uma. Sabia das dificuldades enfrentadas pelos pais, as quais também se refletiam no seu dia a dia.

A noite chegou, e com ela uma febre constante que não cedia com os medicamentos costumeiros.

Sua mãe velou o seu sono inquieto a noite toda, e num dos seus delírios febris, falou na árvore de natal. Foi assim que ela, a sua mãe, descobriu o motivo de tanta febre.

Mal amanheceu o dia foi bater à porta de dona Josefa e pedir um galho do pinheiro. Justificou as dificuldades financeiras enfrentadas, o que a impedia de comprar uma, e o fato da sua filha estar enferma por desejar a bendita árvore de natal.

Entendendo as razões daquela mãe, dona Josefa trouxe um galho do pinheiro e o entregou juntamente com umas bolinhas tão pequeninas, que pareciam gotas de chuva.

Agradecida dona Jandira dispôs o seu serviço como costureira à vizinha, em forma de pagamento.

Voltando a casa, encheu uma latinha de leite em pó, com terra, espetou o galho, colocou as bolinhas e levou até a cama, onde sua filha estava ainda queimando com febre.

Ao se deparar com o presente os olhos da menina brilhavam tanto que pareciam que iam sair da órbita. O sorriso tomou conta daquele pálido rostinho, que foi ganhando vida a cada suspiro que dava.

De repente, pediu para a mãe, uns pedacinhos de algodão. A mãe perguntou a razão do uso do algodão naquele momento…

Voltando-se para a pequena árvore, disse: Natal sem neve não é natal!

Coisas de criança…