Sinais de crise na viagem de Lula à China

Ney Lopes

 

O Brasil continua sendo vítima das declarações desconexas e intempestivas dos seus últimos Presidentes, gerando crises e impasses para o país.

Na psicologia existe a patologia da logorréia ou logomania, que é um transtorno comunicativo, em que a pessoa fala compulsivamente e tem um discurso incoerente.

A pessoa com esse transtorno sente uma vontade incontrolável de falar e não pesa o que diz.

Infelizmente é o que parece ter acontecido com Bolsonaro e agora Lula.

Inegavelmente, Lula tenta recolocar o Brasil no cenário internacional.

Entretanto, é o caso de lembrar o provérbio chinês: “O destino lhe atira uma faca. Cabe a você decidir se pegará pelo cabo e usará a seu favor ou a pegar pela lâmina e se cortará”.

Nada a opor a aproximação com a China.

A China é o principal parceiro comercial do Brasil.

O comércio bilateral atingiu em 2022  a US$ 89,7 bilhões, o terceiro recorde anual consecutivo.

O Brasil desempenha, em particular, um papel importante na segurança alimentar da China, compondo mais de 20% das importações agrícolas do país asiático.

Porém, a visita oficial à China deixa rastros de séria crise diplomática, pela forma como o Presidente Lula se referiu aos Estados Unidos.

Na viagem a Washington, Lula assinou declaração em que criticava a invasão da Rússia ao território da Ucrânia, um dos objetivos da diplomacia americana.

Já na declaração firmada na China, o Brasil reconhece publicamente que “recebeu positivamente ” o plano de paz de Beijing para o conflito, que é formulado em acordo com a Rússia.

Analistas identificam uma “jogada” de russos e chineses, vendo com simpatia o Brasil afastar-se da Casa Branca e construir um grupo de países que seria “supostamente imparcial” para negociar uma solução do conflito.

Mas, tudo indica que não dará certo.

Os jornais “Wall Street Journal” e “Washington Post” publicaram editoriais sob os títulos “Xi Jinping, da China, e Lula, do Brasil, assumem postura unida contra os Estados Unidos” e “Ocidente esperava que Lula fosse um parceiro. Ele tem seus próprios planos”.

Por outro lado, Lula foi claríssimo ao manifestar o desejo de aliar-se à China, ao afirmar que quer trabalhar com Pequim para “equilibrar a geopolítica mundial” e “ampliar as trocas comerciais”.

Foi mais além ao declarar: “Ninguém vai proibir aproximação entre Brasil e China”.

Não se trata obviamente de “proibição”, mas o Brasil não pode afastar-se dos Estados Unidos. Terá que manter abertas as portas de Washington e Pequim.

Afinal, a história mostra que os Estados Unidos foram o primeiro país a reconhecer a independência do Brasil em 1824.

O rápido reconhecimento da independência do Brasil foi motivado pela Doutrina Monroe, diretriz de política externa criada pelo ex-presidente James Monroe, 1817-1825, que defendia “a América é para os americanos”.

No cenário geopolítico atual, o Brasil tem todas as condições para manter a posição histórica de sua competente diplomacia, sempre numa linha multilateral e realista.

O país com 200 anos de tradição diplomática sólida e admirada no mundo, não pode envolver-se em posições que desequilibram até a geopolítica mundial.

Ninguém pode desconhece os manuais da guerra, que citam teoria conhecida como Armadilha de Tucídides, a qual postula que, quando uma potência em ascensão ameaça o papel dominante de uma outra potência estabelecida, o embate é quase inevitável.

 E, ao que parece, já começou.

Uma segunda Guerra Fria, à moda da anterior, entre Estados Unidos e China significa que estamos diante de um novo conflito, mesmo considerando que os dois continuam ganhando com trocas comerciais.

Lula ao final da viagem cancelou a entrevista à imprensa, alegando que a agenda do dia havia sido “muito intensa” e ele “estava o pozinho da rabiola”, muito cansado.

Nada disso.

Certamente alguém o alertou e ele evitou novas e desastradas declarações, colocando o país como parceiro de Pequim e de Moscou e no mínimo criando dúvidas em relação aos Estados Unidos.

O coroamento da logorréia lulista foi dar um “carão” nos Estados Unidos, ao afirmar de alto e bom som: “parem de incentivar a guerra e comecem a falar em paz”.

A única conclusão é que Lula inviabilizou a sua intenção de tornar-se “mediador” na guerra da Ucrânia.

Melhor falar menos, de agora por diante.

 Ney Lopes – jornalista, advogado, ex-deputado federal; ex-presidente do Parlamento Latino-Americano, procurador federal – [email protected] – blogdoneylopes.com.br

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