Saudades

 

Clauder Arcanjo

 

Eu pensava que o tempo curava esta saudade, porém, qual o quê, quanto mais os dias passam, mais eu me lembro de você.

Se escuto uma notícia sobre a guerra da Ucrânia, logo imagino as suas palavras, mansas e justas:

— O mundo parece que não aprende, filho!

Ao presenciar uma cena de desunião entre casados, assoma aos meus olhos o seu carinho com a querida Maria Djanira, a amada-namorada, nossa mãe.

— Venha para cá, minha filha.

Quando soubemos da luta em busca de saúde de Maria José, a Dedé, sua única filha, uma voz ecoou nos ouvidos nossos:

— Tudo vai dar certo. Tenham fé!

E eu pensava que esse vácuo pela sua falta, depressa se aquietaria. Qual nada! O vácuo só aumenta, como se ao redor dos meus passos me acercasse um buraco negro, ocasionado por indescritível falta.

Ah, papai, seria egoísmo de minha parte tanta saudade de você?

Quantas vezes, alta noite, perdido em pensamentos, tomado por algumas preocupações, acordo e, insone, caminho pela casa, como se a buscar por sua palavra, a catar na memória um conselho, uma orientação, um rumo. Ao me recolher novamente, entre os lençóis o verbo cálido ecoa em mim:

— Não queira consertar o mundo, filho, seja apenas um canalha a menos.

E, no dia novo, vida nova. De energia recarregada, enfrento as procelas da rotina, como se guardar o seu exemplo, pai, me tornasse inexpugnável, invencível.

Hoje, treze de março de 2023, completaria 92 anos. Acordei sem sua presença física, outro ano sem você. O céu invadido por um azul estranho; no nascente, nuvens pesadas. Ao descer e caminhar pela rua, tive a impressão de alguém seguindo-me: um vulto com as mãos postas para trás, a barba bem tirada, a cabeça um pouco baixa, a cabeleira gris elegante, penteada com um pouco de brilhantina.

Parei ao seu lado, e chorei. Você pôs em mim seu olhar manso, como a me demonstrar:

— Sempre estarei com vocês.

Sim, mil perdões, pai. Nossa gratidão aos céus pela graça de termos tido o prêmio da sua paternidade. Ninguém morre quando se torna inesquecível. Você habita em nós, eterno mestre: em cada gesto, em cada decisão, nas mínimas atitudes…

— E como vai a política em Santana, Antonio Clauder?

Um riso escapa por entre os meus lábios até então tristonhos, e elevo os olhos para o firmamento, antes de responder:

— Você ainda a gostar de política, hein, meu velho?

Uma chuva banha a cidade nesta segunda-feira; entre um aguaceiro e outro, algo ressoa em meus ouvidos:

— Se os homens sérios não cuidam de sua terra, filho, os ratos vêm e tomam de conta dela.

Feliz aniversário, bom Zequinha. Sua bênção; D

­­eus o guarde, para todo o sempre.

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