RN já registra 32 entregas voluntárias de crianças para adoção neste ano

A entrega voluntária de bebês recém-nascidos para adoção é garantida legalmente e regulamentada pela Lei da Adoção (13.509/2017), existente no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), possibilitando uma gestante ou mãe entregar seu filho, em um procedimento assistido pela Justiça. O conhecimento da lei pode ser um caminho para evitar que se repitam tantos casos de abandono de bebês, como registrado no último fim de semana em São José de Mipibu, onde a criança foi encontrada dentro de uma caixa de sapato.

 

No caso do ocorrido em São José de Mipibu, o juiz da Vara da Infância e Adolescência, José Dantas, explicou que essa criança deve ser acolhida em um prazo de até 30 dias por algum familiar, caso ultrapasse essa data limite, é direcionado para o sistema de adoção. “Caso alguém venha encontrar casos semelhantes é importante que direcione a uma unidade de saúde para que seja feito os primeiros atendimentos. E assim que o hospital tenha conhecimento, deve comunicar ao juiz da Comarca para identificar a família. Caso essa localização não seja possível, esse bebê não seja acolhido por nenhum familiar, o juiz pode determinar que a adoção seja feita pela primeira família na fila de adoção que consta no Sistema Nacional de Adoção”.

No Rio Grande do Norte, o programa “Atitude Legal”, desenvolvido pela Coordenadoria da Infância e Juventude (CEIJ), do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, tendo como objetivo desenvolver ações em parceria com as unidades de saúde e assistência social, que atendem gestantes e mães biológicas, para identificar e dar o devido atendimento às situações de possível entrega de criança para a Adoção.

 

O juiz José Dantas explica que, desde 2015, o programa é desenvolvido para capacitar uma equipe multiprofissional para acolher mães que por livre e espontânea vontade não desejam criar seus filhos. “A alteração no ECA permite que toda gestante que desejar entregar o recém-nascido para adoção está amparada legalmente. Aqui no estado, essa mulher será acolhida por uma equipe da Vara da Infância, tanto para ela como para o bebê. Desde 2015 que preparamos toda rede de atendimento para oferecer esse suporte”.

 

O magistrado explica ainda que todo esse trâmite é rápido e atuante em todo território estadual. “Toda nossa rede de atendimento, formada por juristas, psicólogos, técnicos, estão capacitados para receber esse tipo de caso. Assim que recebemos a notificação, encaminhamos para a Vara da Infância de cada cidade e a criança não passa de 10 dias, nos centros de acolhimentos, e recebem o direcionamento para uma família”. Nos últimos dois anos, o programa realizou o atendimento de 35 casos de doação voluntária.

O Programa Atitude Legal articula e dá o suporte para a formação dos profissionais de toda a rede (saúde, assistência e proteção social) que venham a atender estas mulheres desde o pré-natal até o nascimento da criança, ou seja, não só nas maternidades, mas, também, nas demais Unidades de Saúde e outros órgãos, como os da Assistência Social, a exemplo dos CREAS e CRAS. Na rede, os profissionais já com o conhecimento da lei sobre a obrigatoriedade do encaminhamento destas mulheres à Justiça da Infância e Juventude, assim o fazem e o atendimento segue o fluxo adequado e legal.

 

Mais de 50 gestantes foram atendidas de janeiro a outubro de 2023

Segundo os dados fornecidos pela Coordenadoria Estadual da Infância e da Juventude – CEIJ, responsável por esse acompanhamento em todo Estado, no primeiro semestre deste ano – entre janeiro e junho- de 2023, foram realizados 32 atendimentos a gestantes, em nove comarcas espalhas pelo RN. Já no número de entregas, ao qual a parturiente de fato não desejou criar filho, foram 15 entregas. A coordenadoria chama atenção para o número de desistências ao longo desse primeiro semestre, que chegou a 17 através do trabalho conjunto da equipe.

 

Neste segundo semestre, até o mês de outubro, o programa já registrou 22 atendimentos as mulheres, destes 17 confirmaram a vontade de entregar seus filhos ao programa de adoção, um número superior ao semestre anterior. No número de desistências, foram apenas 7 até este mês.

MATERNIDADE JANUÁRIO CICCO

Gildeci Pinheiro, assistente social da Maternidade Escola Januário Cicco, unidade hospitalar da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, vinculada à Rede Ebserh, explicou que a unidade tem um importante papel nesse diálogo entre a mãe e a justiça, pois existe todo um protocolo a ser adotado. “Os nossos profissionais identificam esse desejo da mãe em não querer ficar com o bebê, então o direito dela é respeitado e assegurado por lei. Conversamos para saber se de fato é um desejo sincero, sendo positivo nós acionamos a 2ª Vara da Infância, através de telefone e e-mail”.

 

Com a chegada da equipe judicial, a assistente social explica que existe uma nova rodada de conversas com uma equipe preparada para aquele momento. “Quando a equipe chega, conversamos mais uma vez com essa mãe e confirmado esse desejo de prosseguir com o processo, a criança fica aos cuidados da equipe de enfermagem da maternidade até a decisão judicial sair orientando se essa criança terá um cuidador na maternidade ou após a alta seguirá para um acolhimento”.

Gildeci explica ainda que mesmo com a audiência realizada, a mãe pode desistir do processo e retomar a guarda do seu filho. “Explicamos a questão da audiência, que mesmo após um período ela pode vir a desistir do processo para que retome a guarda e a criança não seja encaminhada para adoção”.

 

A profissional relembra casos de mulheres que estavam decididas e comunicaram desde o início da internação na unidade. “Já tivemos casos aqui (maternidade) da mãe realmente não querer o bebê e a criança ficar mais dias internada até que vem o casal – pretendente da adoção – e acompanham a criança ainda internada. Porém, tem casos também que fica apenas um cuidador até o momento que o juiz fizer essa definição”.

 

Enfatizou ainda que antes, durante e depois do processo o sigilo sobre a identidade dessa mãe precisa existir, a fim de que não haja constrangimentos para essa mulher. “Mesmo após a visita da psicóloga responsável para buscar a criança para o acolhimento, então a identidade dessa mulher precisa ser preservada e os profissionais de saúde precisam estar livres de qualquer pré-conceito para o que diz sobre adoção, sempre buscando respeitar o direito e a vontade da mulher”, finalizou Gildeci.

Deixe um comentário