Raimundo Carlyle – Por que a grama do vizinho parece sempre mais verde?

Raimundo Carlyle
Juiz de Direito em Natal/RN

O Portal da Transparência do Governo do Estado do RN permite verificar que o orçamento geral para 2016 contém previsão de receitas da ordem de R$ 10.532.262.000,00 (10,5 bi), um pouco menor que o do vizinho estado da Paraíba que é de R$ 10.879.760.126,00 (10,8 bi), ou seja, trezentos e cinquenta milhões de reais maior. Quanto à realização das Receitas, o acumulado até o mês de agosto de 2016 era de R$ 6.330.303.723,89 (6,3 bi) no RN contra R$ 6.334.086.109,61 (6,3 bi) na Paraíba.
Referente aos gastos diretos (Despesas), até o citado mês, o RN tinha liquidado R$ 4.758.069.127,56 (4,7 bi) e a Paraíba executado R$ 6.166.752.292,66 (6,1 bi). Ou seja, a Paraíba arrecadou apenas quatro milhões a mais e executou/liquidou despesas 1,4 bilhão de reais maiores que o RN, no mesmo período, caso as informações dos portais consultados estejam corretas!
No tocante ao número de servidores ativos e inativos (aposentados e pensionistas) da administração direta e indireta do Poder Executivo do Rio Grande do Norte, a folha bruta de pagamentos de agosto de 2016 indica 93.826 servidores, sendo 57.003 ativos, 36.823 inativos e 10.481 pensionistas, para um total pago de R$ 426.703.207,17.
Na vizinha Paraíba, o número de servidores ativos e inativos (aposentados e pensionistas) da administração direta e indireta do Poder Executivo é maior que no RN, mas a folha de pagamentos de agosto de 2016 foi menor!
O Executivo paraibano tem 115.871 servidores, sendo 79.676 ativos, 32.230 aposentados e 3.965 pensionistas, com um total pago de R$ 352.399.482,60. Talvez os números expliquem o déficit previdenciário existente no RN, especialmente a diferença (a maior) da folha bruta mensal do Executivo do RN em relação ao da Paraíba de R$ 74.303.724,57 em agosto.
Concernente aos repasses a outros poderes com autonomia administrativa e financeira, sem considerar as dotações dos fundos especiais do Poder Judiciário, Ministério Público e da Defensoria Pública, de ambos os estados, no acumulado em agosto de 2016 (janeiro a agosto), o Executivo do RN repassou ao Ministério Público R$ 181.103.214,23, à Defensoria Pública R$ 22.465.558,02, ao Tribunal de Justiça R$ 542.095.521,74, ao Poder Legislativo R$ 203.844.551,22 e ao Tribunal de Contas R$ 56.211.427,77.
No mesmo período, o Executivo da Paraíba repassou ao seu Ministério Público R$ 140.286.407,27, à Defensoria Pública R$ 44.972.082,35, ao Tribunal de Justiça R$ 364.527.917,17, ao Poder Legislativo R$ 178.144.973,30 e ao Tribunal de Contas R$ 76.377.999,43. Observa-se uma diferença (a maior) nos repasses realizados a outros poderes pelo Executivo do RN de R$ 201.410.893,46, no acumulado de janeiro a agosto de 2016, com relação ao Executivo paraibano, segundo dados dos seus respectivos portais da transparência.
A existência do Estado deve ser justificada pela sua capacidade de prestar serviços essenciais aos cidadãos, basicamente saúde e segurança, mas também deve suprir o pagamento em dia dos salários dos seus servidores, fornecedores de insumos e prestadores de serviços, além de fomentar o desenvolvimento econômico e promover a diminuição das desigualdades sociais.
Assim, parece ter chegado a hora de dividir os poucos “pães” pelas muitas bocas, e a sugestão imediata apontada pelos servidores públicos do Executivo potiguar seria a devolução pelos demais Poderes autônomos de seus superávits orçamentários e financeiros ao Tesouro estadual.
A medida proposta é impactante e de alta relevância social, porém não redimensionará a crise orçamentária e financeira vivida pelo estado, que não se resume ao atraso e parcelamento dos salários, mas a inexistência de “fluxo de caixa” compatível com as despesas assumidas pelo Erário no curto, médio e longo prazo.
Saliente-se que o Tribunal de Justiça do RN já “emprestou” recursos ao Executivo potiguar duas vezes: uma para auxiliar no pagamento da folha de pessoal no final do governo Iberê Ferreira (2010: 7 milhões de reais) e, recentemente, para a construção de uma unidade prisional (2016: 20 milhões de reais). Agora, o presidente do TJRN anuncia que pretende destinar cem milhões de reais para as áreas da Saúde e da Segurança…
Urge mencionar que o estado do RN necessita de novas receitas para manter sua máquina funcionando, ou cortar ainda mais fundo na própria carne, como recomendado pelo Ministério Público, e já rechaçado pelo próprio governo. As dificuldades financeiras que assolam o Rio Grande do Norte não são inusitadas nem solitárias, pois o estado tem a companhia de boa parte dos seus irmãos federativos no mar revolto das finanças públicas brasileiras.
Alguns estados estão adequando suas estruturas (Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro, por exemplo), redimensionando suas máquinas, extinguindo empresas públicas deficitárias, alienando ativos, promovendo enxugamentos, integrando ações e órgãos com atribuições sobrepostas, cortando cargos comissionados e veículos de representação, reduzindo os serviços terceirizados, devolvendo policiais cedidos ao serviço de rua… Enfim, “reinventando o governo”!
Portanto, se não existir outro tipo de milagre na multiplicação dos “pães”, a saída será dar a cada um o seu quinhão da pouca sorte. No dizer do Pe. Antônio Vieira, “Quando os remédios não têm bastante eficácia para curar a enfermidade, é necessário curar os remédios, para que os remédios curem ao enfermo.”