Normalizando o extraordinário

 

Adolf Hitler foi um das pessoas com maior capacidade de liderança do século passado. Ora, ele convenceu milhões de indivíduos, por exemplo, que assassinar milhões de pessoas em câmaras de gás simplesmente porque elas eram diferentes seria uma coisa justificável. Liderança não necessariamente é para uma coisa boa.

O líder tem entre suas qualidades, a capacidade de fazer com que as pessoas adotem suas ideias, que passem a achar normal comportamentos ou teses que outrora ninguém sequer ousaria falar em público. E a repetição do discurso consolida cada vez mais na cabeça das pessoas a ideia de que aquilo é comum e aceitável. Em um tempo em que cada um procura sua (fake) news para corroborar sua fala, isso se torna ainda mais perigoso.

No momento atual, esse comportamento intolerante encontra guarida em ambos os extremos do pensamento político. Seja ele de esquerda, seja na direita. E seus principais líderes tem responsabilidade, mesmo não podendo serem culpados diretamente pelos atos de intolerância praticados por.

O aumento do discurso de ódio não é exclusividade do Brasil. Na Inglaterra e País de Gales, a quantidade de crimes de ódio (aquele cometido porque a pessoa pertence a um grupo ou tem opinião divergente) mais que dobrou nos últimos cinco anos, após o acirramento das discussões e votação do Brexit (saída da Grã-Bretanha do Reino Unido). Nos Estados Unidos também houve o aumento após a eleição de Donald Trump.

Enquanto líderes fizerem pouco caso dos episódios de agressão por racismo, misoginia, orientação sexual, ou ainda pior, incitar esse tipo de crime, não esperemos por dias melhores. Se os líderes, sejam eles quem forem, não respeitam as instituições, como a imprensa ou poderes constituídos, por que seus seguidores o fariam?

Enquanto o jornalismo buscar a verdade (sem proteger A ou atacar B por interesses espúrios) e, por exemplo, o judiciário cumprimento das leis (sem abusos e privilégios), teremos um contraponto, um freio nos mais autoritários. As instituições democráticas precisam ser fortalecidas e preservadas. A falta de confiança nas instituições fortalece crimes de ódio, desobediências às regras democráticas e, mais um exemplo, a proliferação de fakenews.

Como disse Kyle Pope, editor-chefe da Columbia Journalism Reviews, da Universidade Columbia, principal publicação sobre mídia dos EUA: não podemos normalizar o comportamento extraordinário dos líderes nem de ninguém. Agressões às instituições democráticas ou crimes de ódio não podem ser tolerados como normais.