NA ESQUINA – Clauder Arcanjo

     As pessoas passavam indiferentes e não davam pela minha presença.
Do outro lado da rua, a sua silhueta. Eu não reparava em mais nada, tão
somente os olhos voltados para a outra esquina.
— Cândida?
O barulho do tráfego abafava a minha voz. Em desespero resolvi
atravessar.
Uma buzinada me traz de volta.
— Maluco!…
Sim, sempre assim ela me chamava quando nos conhecemos: “Seu
maluco!” A memória daquele tempo me tornou ainda mais indiferente aos
veículos a transitarem nas demais faixas. Uma barulheira infernal de motores,
buzinas, vozerio.
— Maluco! Maluco!…
Ao me aproximar da calçada, vi que ela se afastara, caminhando a
reparar nas promoções expostas nas vitrinas. Parou.
Lembrei-me de quando andávamos juntos; ela, sem avisar, estancava e
ficava absorta a viajar em pensamentos. Eu tentava lhe arrancar alguma
resposta: “O que houve?”. Ela olhava em minha direção, o olhar perdido, como
a avistar coisa não presente. Eu não insistia. Tão depressa como divagava,
depressa ela retornava. Geralmente mais meiga. Beijando-me, dizendo-me que
me amava, e como eu a entendia.
— Laranja?
Ali próximo um vendedor nos oferecia o seu produto.
— Não, meu senhor. Muito grato.
Com aquela oferta foi que reparei no vestido que ela usava. Modelo
elegante, tecido de cor alaranjada. Tudo sempre lhe caía bem.
— São seus olhos…
— O que o senhor disse?
— Nada não. Minhas desculpas. Estava aqui a pensar comigo mesmo.
Nada não.

     PÚBLICA

Segui. Quando me aproximei, ela sorriu e eu me vi pleno de alegria, de
satisfação, de puro prazer com a vida.
Abri-lhe o meu melhor sorriso e acelerei os passos pela calçada tomada
pelo movimento das compras.

& & &

     Parei.
Na esquina. As pessoas, indiferentes. Do outro lado da rua, a silhueta de
um homem. Os seus olhos desesperados.
— Cândida!…
Um freio forte.

*Clauder Arcanjo é escritor e editor, membro da Academia Norte-rio-
grandense de Letras.

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