França se preocupa com possível polarização política de torcedores brasileiros na Copa

A dois dias do segundo turno no Brasil, a campanha eleitoral ganha forte repercussão na Europa. Na França, onde o futebol brasileiro é adorado, questiona-se se a polarização política vai dividir a torcida na Copa do Mundo, que tem início em 20 de novembro.

Até que ponto uma disputa eleitoral pode interferir nos esportes e em uma torcida nacional? O jornal esportivo francês L’Equipe aborda as tensões em torno da camisa da Seleção Brasileira de futebol em uma matéria assinada pelo correspondente do diário no Rio, Eric de Frosio.

Para o repórter o “verde e amarelo” se tornou, nos últimos anos, “símbolo do nacionalismo exacerbado encarnado por Bolsonaro”. Segundo a matéria, “para promover o patriotismo descomplexado do presidente, seus partidários se apropriaram da camisa da Seleção e da bandeira brasileira”.

De fato, a emblemática “amarelinha” também é utilizada como um veículo de propaganda pelo governo. Na época em que era presidente dos Estados Unidos, Donald Trump foi presenteado com a camisa da Seleção. O uniforme também é utilizado por Bolsonaro em alguns de seus comícios de campanha.

De Frosio afirma que, a menos de um mês da Copa do Mundo de Futebol, vai ser complicado vestir a camisa amarela da Seleção sem ser visto como um bolsonarista ou “sem ser relacionado a um fascista”.

Camisa azul

O repórter do L’Equipe entrevistou representantes do Movimento Verde e Amarelo, grupo de torcedores brasileiros fundado em 2008, que lamenta que a camisa da Seleção esteja sendo utilizada para fins políticos. Há meses, muitos brasileiros que se sentem incomodados com a relação das cores da bandeira a bolsonaristas afirmam que pretendem usar a camisa azul para torcer para o Brasil na próxima Copa do Mundo, no Catar.

Não apenas torcedores se irritam com essa apropriação política de um símbolo nacional, mas jogadores também. O atacante Richarlisson, do Tottenham, na Inglaterra, manifesta incômodo com essa situação. Segundo ele, a camisa do Brasil, que está perdendo a sua essência, “é a representação de um povo inteiro e não apenas de uma parte da população”.

Para encontrar uma solução para essa situação, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) lançou novas versões da camisa da Seleção, nas cores amarelo e azul. No lançamento desse novo modelo, a entidade lembrou, no Twitter, que o objetivo é homenagear a coragem e a cultura de um povo e unir todos os brasileiros. Uma tentativa da CBF de se distanciar da polêmica envolvendo essa apropriação política de símbolos do Brasil, segundo o L’Equipe.

Apoio de jogadores a candidatos

O apoio de Neymar a Bolsonaro gerou forte polêmica na França. Antes do 1° turno, em 30 de setembro, o atacante do PSG publicou um vídeo no TikTok cantando uma música a favor da reeleição do presidente. No último domingo (23) Neymar participou de uma live com Bolsonaro e prometeu homenageá-lo quando marcar seu primeiro gol na Copa.

O jornal Libération é um dos que mais critica a atitude de Neymar. O diário se diz “surpreso” com a manifestação do atacante a favor de Bolsonaro, uma atitude classificada de “esquizofrênica”. “Muitos dos jogadores da Seleção são negros ou pardos, e são os primeiros a ficar indignados, com razão, quando há casos de racismo nos jogos”, diz a matéria. Libé cita algumas das declarações racistas do presidente nos últimos anos e não vê sentido que jogadores brasileiros vítimas de racismo votem em Bolsonaro.

O jornal esportivo espanhol El Mundo afirmou que, apesar do apoio acalorado do Neymar a Bolsonaro, o atacante do PSG não votou. O diário descobriu que Neymar não transferiu seu título de eleitor para Paris e seu local de voto continua sendo São Paulo.

Já a rádio francesa RMC aponta a falta de cultura política entre alguns jogadores que apoiam Bolsonaro, como Lucas Moura. Em um tuíte, o meio-campista do Tottenham chegou a comparar o socialismo ao nazismo.

Entre os jogadores brasileiros na Europa, também há manifestações pró-Lula. É o caso de Paulinho, atacante do Bayer Leverkusen, na Alemanha, que declarou voto no candidato petista.

Já o ex-jogador Raí, que mora em Paris e estuda Ciências Políticas na prestigiosa universidade Sciences Po, publicou, no início deste mês, um vídeo em sua conta no Instagram e declarou seu apoio a Lula. Há poucos dias, durante a cerimônia da Bola de Ouro, Raí fez um discurso e evocou o engajamento de seu irmão, Sócrates, pela volta da democracia no Brasil. Ao terminar a homenagem, fez o gesto “L” com a mão, em referência a Lula.

Outro apoiador do candidato petista no meio do futebol é Juninho Pernambucano, ex-jogador do Olympique Lyonnais, na França. O ex-craque, que nunca escondeu seu engajamento à esquerda, chegou a participar da propaganda eleitoral de Lula neste ano.

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