Cubanos votam em plebiscito para legalizar união homoafetiva e avanços nos direitos da família

Os cubanos começaram a votar, neste domingo (25), no plebiscito sobre o novo Código das Famílias, uma ampla legislação que prevê a legalização do casamento homoafetivo e a adoção por casais do mesmo sexo, além de reconhecer a barriga de aluguel e a multiparentalidade, entre outros direitos. É a primeira vez que os cubanos votam para a validação de uma lei.

O presidente cubano, Miguel Díaz-Canel, votou nas primeiras horas da manhã, acompanhado da esposa, Lis Cuesta, no município de Playa, no oeste da capital. O Código das Famílias “é uma norma justa, necessária, atualizada, moderna e que dá direitos e garantias a todas as pessoas, a todas as diversidades de famílias, de pessoas, de credos”, declarou o presidente à imprensa após depositar seu voto na urna.

Cerca de oito milhões de cubanos são esperados nas urnas para responder “sim”, ou “não”, à única pergunta escrita na cédula: “Você concorda com o Código das Famílias?”. Se aprovada, a nova legislação substituirá a que se encontra em vigor desde 1975.

O texto proposto define o casamento como a união “entre duas pessoas”, abrindo a porta para o casamento homoafetivo e à adoção para casais do mesmo sexo. Também permitirá o reconhecimento legal de vários pais e mães, além dos biológicos, assim como a barriga de aluguel – desde que sem fins lucrativos –, além de agregar outros direitos que favorecem crianças, idosos e deficientes.

Vários destes temas são sensíveis em uma sociedade ainda marcada pelo machismo que se exacerbou nas décadas de 1960 e 1970, quando o governo condenou muitos homossexuais ao ostracismo, ou enviou-os para campos militarizados de trabalho agrícola. Nas décadas seguintes, as autoridades mudaram e, agora, o novo código tem sido objeto de uma intensa campanha midiática por parte do governo.

“Não estamos votando ‘sim’ com o PCC (Partido Comunista de Cuba). É o PCC que está votando ‘sim’ conosco”, frisou o ativista gay Maykel González, em sua conta no Twitter, mostrando sua cédula marcada com o “sim”.

“Não tenho esses preconceitos”

Na América Latina, o casamento igualitário é legal na Argentina, no Uruguai, no Brasil, na Colômbia, no Equador, na Costa Rica, no Chile e em vários estados mexicanos.

“Há alguns anos, eu não teria aceitado este código, mas (…) é preciso se atualizar. Este é um código muito humano, totalmente inclusivo”, disse à AFP Elio Gómez, um ex-professor de marxismo de 78 anos, em uma seção eleitoral do centro histórico de Havana. O ex-professor acredita que muitos cubanos sofreram preconceito e que o código vai “saldar uma dívida com eles”.

O governo tentou introduzir o casamento entre pessoas do mesmo sexo na Constituição de 2019, mas teve de recuar diante das fortes críticas das igrejas católica e evangélica. Em um comunicado, a Conferência Episcopal de Cuba voltou à briga este mês, opondo-se a vários pontos do texto, como a adoção por casais do mesmo sexo, gravidez assistida e paternidade ampliada.

Entre fevereiro e abril, foi realizada uma consulta sobre o Código das Famílias em 79.000 reuniões de moradores, bairro a bairro. Isso levou a uma modificação de 48% do texto original.

“Perdeu a mão”

O amplo espectro do Código das Famílias, de quase 500 artigos, alimenta, no entanto, dúvidas entre alguns que concordam, por exemplo, com o casamento entre pessoas do mesmo sexo, mas não com a adoção.

Para o cientista político cubano Rafael Hernández, esta é a “peça de legislação mais importante em matéria de direitos humanos” elaborada em Cuba após as grandes mudanças no início da Revolução de 1959. E, pela primeira vez, acrescenta Hernández, há grupos alegando que o governo “perdeu a mão”, ao cumprir “demais” o que foi prometido.

“O governo está tornando mais fácil para os setores mais conservadores da sociedade se tornarem visíveis com suas próprias ideias, sem maquiá-las”, explicou.

Em um contexto de profunda crise econômica, de êxodo migratório e mais de um ano depois das históricas manifestações de 11 de julho de 2021, há cidadãos tentados a se absterem de votar em protesto.

“Acho que fui um dos primeiros a dizer ‘não’. Aqui não tem comida, produtos de higiene. Estamos sobrevivendo, e com vários apagões. Não vejo razão para dizer ‘sim'”, alegou José Antonio Callejas, de 47 anos, na saída de uma seção eleitoral em Havana Velha.

Os opositores têm ido às redes sociais para convocar que se vote contra o texto, ou para defender a abstenção. A lei entrará em vigor imediatamente, se obtiver mais de 50% dos votos.

Com informações da AFP

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