Coluna: Por que estamos sempre cansadas? Mulheres e as jornadas que todo mundo vê, mas ninguém considera

POR QUE ESTAMOS SEMPRE CANSADAS? MULHERES E AS JORNADAS QUE TODO MUNDO VÊ, MAS NINGUÉM CONSIDERA

 

“Tô tão cansada”. “Mulher, tô muito cansada”. “Ainda é terça-feira e já quero que o final de semana chegue”.

Essas são algumas poucas amostras do que mais tenho escutado das mulheres ao meu redor. Mulheres que são mães, professoras, donas de casa, estudantes, filhas, casadas, solteiras. Parei para refletir sobre isso quando percebi que junto às reclamações de cansaço, vem aquilo que talvez seja o pior: a invisibilidade e a culpa. Estamos sempre nos culpando, porque ao redor a maioria não considera a sobrecarga.

Já falei com vocês em outro texto que nós temos atribuições históricas que são ditas como “naturais”, todas elas relacionadas à um padrão feminino cuidador e responsável pelo bem-estar do outro. Porém, além do cuidado e do bem-estar, a evolução da sociedade nos abre mais uma porta: o trabalho produtivo, aquele do mercado de trabalho formal e informal. Essa abertura cria pra nós o fenômeno da “dupla jornada de trabalho”; essas aspas se autoexplicam mais a frente.

A dupla jornada se caracteriza pela realização das atividades domésticas e de cuidado com o núcleo familiar depois de realizada uma jornada de trabalho fora de casa. Mas essa dupla jornada não é só dupla; ela se torna tripla, porque além do trabalho remunerado, as mulheres têm o trabalho doméstico e o trabalho familiar.

Além de, nos espaços de trabalho remunerado, as mulheres receberem menos que homens e ocuparem funções de menor complexidade e/ou status social – o que é justificado pela ideia de que intelectualmente as mulheres são menos capazes ou mais adequadas às atividades ligadas ao cuidado, à delicadeza, soma-se as horas de trabalho não remunerado que são descredibilizadas. O Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça, publicação do Instituto de Pesquisa Aplicada em parceria com a ONU Mulheres, aponta que, em 2023, as mulheres trabalharam 7,5 horas a mais que homens, mas com um agravante: 90% das mulheres pesquisadas realizam atividades remuneradas, enquanto essa é uma realidade para menos que 50% dos homens.

O que podemos entender é que é nítida a sobrecarga totalmente desproporcional entre homens e mulheres no que se refere ao trabalho, graças à um padrão social que nos atribui TODA a responsabilidade pelos cuidados domésticos e familiares.

Retornando ao início, vamos pensar sobre a quantidade de adoecimentos, físicos, psíquicos e emocionais, que são ocasionados por essa sobrecarga… Ansiedade, culpa, sensações de insuficiência e incapacidade. São inúmeros os efeitos ocasionados pelo peso de ter que “dar conta de tudo” que carregamos.

Mais cedo, comentava com outras mulheres e trarei pra cá, pra provocar a reflexão: “O mundo inteiro nos vê em movimento, mas ninguém considera que tudo que fazemos ou é trabalho, ou é trabalhoso”.

Escrita por: Gabriela Soares

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