Clauder Arcanjo – Continhos de junho

Para Artur Praxedes Arcanjo

 

                                            Nil

 

— Alguém me ligou?

— Ninguém.

— Algo para mim?

— Nada.

— Alguma sobra?

— Nenhuma.

— No meu futuro, algo à vista?

— Deixe-me ler os búzios. Hummm… A resposta está em inglês: “NIL”. No mínimo, deve ser “zero”.

 

***

 

                                             Queda

 

— Caíste?

— Sim. Deu-se o que tu esperavas.

— Não te entendo. Como assim?

— Tu oravas por minha desgraça, por não ter venturas em ti. O meu riso te maltratava, o meu sorriso te consumia. O que, para mim, era siso; para ti, evidente e inconteste sinal de loucura. Palhaço dos teus próprios infortúnios, sonhavas com o crepúsculo dos meus claros dias. Hoje, estou aqui, embaixo dos teus pés, mas com o olhar posto sobre as tuas chagas.

— Chagas? Quais?

— Nunca tu as verás, pois os teus olhos estão cativos dos passos alheios e incapazes de se voltarem para dentro de ti.

— Cairei, então?

— Não agora, o vazio e a sua corrente infinda roerão lentamente a tua demente alma, incrustada no teu corpo pútrido embora rijo.

E a noite se deu num ocaso divinal, batismo de luz e refrigério sobre a terra devastada por seus filhos.

 

Clauder Arcanjo

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