A grande seca de 1877

Geraldo Maia do Nascimento

O ano de 1877 foi terrível para o sertão nordestino. Foi nesse ano que começou a calamidade da mais terrível das secas que flagelaram as províncias do Nordeste no final do século XIX. No Rio Grande do Norte, quase todas as cidades do interior foram atingidas pela intempérie. A população rural, sem alternativa, desabou em busca das cidades. E Mossoró, no oeste potiguar, se viu, de repente, invadida por milhares de retirantes que aqui chegavam em busca da salvação, vestidos de trapos sujos, com algumas crianças nuas, barrigudas e magras. “A população sertaneja, apavorada, empolgada por um terror coletivo, deslocou-se em massa para o litoral seduzida pela miragem fatal dos Socorros mandados distribuir pelo Governo Monárquico”, como nos conta o historiador Oswaldo Lamartine. Muitos não resistiram a viagem e morreram no meio do caminho; outros, os que ainda tinham força para trabalhar, prestaram serviços ao município em troca de alimentação. Foi uma fase negra na história de Mossoró.

Naquele período, Mossoró vivia a fase áurea do seu desenvolvimento. A exemplo da maioria das cidades do interior nordestino, começou a formar a sua economia a partir das atividades agropastoris.  Mas por estar situada em uma área privilegiada, entre duas capitais e sendo o ponto de transição entre o sertão e o litoral tornou-se, já em 1857, uma espécie de empório comercial.  Apesar de não se situar no litoral, contava com um porto, o porto de Mossoró ou porto de Areia Branca, município esse que pertenceu a Mossoró até 1892, quando foi desmembrado.  Com a chegada dos navios da Companhia Pernambucana de Navegação Costeira ao porto de Mossoró em 1857, através de uma subvenção concedida pelo governo provincial, o município se tornou o centro de comercialização de uma área que atingia, além dos municípios vizinhos, uma parte do Ceará e também da Paraíba. Esse fato é, na visão dos historiadores mossoroenses, o primeiro marco na ascensão de Mossoró a empório comercial.  A chegada dos navios fez com que comerciantes de outras praças, principalmente de Aracati/CE, viessem a se estabelecer aqui atraídos pelas oportunidades comerciais que a cidade passou a oferecer. E é esse atrativo que faz com que em 16 de novembro de 1868, o industrial suíço Johan Ulrich Graff se estabelecesse em Mossoró com a famosa “Casa Graff”, alavancando o seu desenvolvimento econômico com idéias mercantilistas, associadas ao   capital aqui investido.

Mas se por um lado o crescimento do comércio atraia grandes comerciantes, por outro lado atraia também os famintos retirantes que buscavam aqui meios de sobrevivência. Em determinado período, chegou-se a registrar nada menos que 70.000 flagelados, segundo nos informa o historiador Câmara Cascudo, vindos de toda zona oeste e de estados vizinhos, na busca de meios de sobrevivência. “Era a fase cruel da seca dos dois setes, prolongando-se até 1879 e mesmo 1880 que ainda reunia grupos famintos pelas ruas da cidade”, nas palavras de Cascudo.

Nesse período, Mossoró era governada pelo caraubense Francisco Gurgel de Oliveira, o Cel. Gurgel. Apesar das dificuldades que teve de enfrentar para socorrer as vítimas da seca, graças aos auxílios conseguidos do governo provincial e até mesmo de particulares distantes, através da Comissão de Socorros Públicos, que era presidida pelo Dr. Manoel Hemetério, conseguiu, o Coronel Gurgel executar vários serviços nas ruas, no rio e por toda parte.

A 4 de março de 1878 a Câmara Municipal oficia ao Presidente da Província: “A maior parte dessa gente não encontrando um teto que lhe sirva de abrigo passa os dias e as noites expostas às intempéries do tempo, ao sol e ao relento, donde resulta principalmente a espantosa mortalidade que atinge a 40 pessoas por dia”.

Foram anos terríveis para Mossoró. A grande seca dos dois setes, como ficou conhecida, marcou profundamente a cidade.

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