Depoimentos da Odebrecht, um divisor de águas para a Justiça eleitoral

EL PAÍS

Gilmar Mendes (C) conversa com os colegas Napoleão Nunes e Tarcísio Vieira no TSE nesta quarta-feira. JOSÉ CRUZ AGÊNCIABRASIL
Gilmar Mendes (C) conversa com os colegas Napoleão Nunes e Tarcísio Vieira no TSE nesta quarta-feira. JOSÉ CRUZ AGÊNCIABRASIL

TSE tem a oportunidade de definir um padrão sobre abuso de poder econômico nas eleições
Cassação de chapa presidencial a partir de denúncias de delação pode ser um passo muito drástico

Os ilícitos denunciados pelos executivos da Odebrecht devem ser levados em consideração no processo que pode cassar a chapa Dilma Rousseff-Michel Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE)? A resposta a essa pergunta começará a ser respondida na retomada do julgamento nesta quinta-feira e pode valer mais do que o mandato do atual presidente da República. “Esse julgamento é tão histórico e importante que ele é um fixador de parâmetros. Ele vai fixar critérios para tudo que vier depois”, diz Silvana Batini, professora da FGV Direito Rio e procuradora regional da República.

“A Constituição não define o que é abuso. Só diz que a gente tem que proteger as eleições do abuso do poder econômico. Então, a construção do que é abuso é feita caso a caso”, diz a professora. “Nesse caso, a gente tem alguns exemplos clássicos: aquele volume imenso de caixa dois, pagamento de marqueteiro fora do país, compra de apoio político de outros partidos, compra de tempo na televisão de outros partidos, desvio de dinheiro estatal através de caixa um e caixa dois. São exemplos muito práticos e pesados e seria a oportunidade da Justiça Eleitoral de dizer: isso é abuso”, completa.

Segundo Batini, a cassação da chapa Dilma-Temer sinalizaria um norte para as próximas eleições, e também para os juízes eleitorais que estão começando a julgar os abusos cometidos no pleito do ano passado. O tom dos debates da sessão desta quarta-feira levou a crer, contudo, que a maioria dos ministros do TSE deve votar para absolver o presidente. E o caminho para fazer isso pode passar por desconsiderar os depoimentos de Marcelo Odebrecht e João Santana concedidos ao relator do processo, o ministro Herman Benjamin.

Para o advogado Silvio Salata, que preside a comissão especial de direito eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil-SP, é impossível as questões relacionadas à Odebrecht serem consideradas no processo. Para ele, os depoimentos deveriam ser considerados provas ilícitas, “porque ainda não foram submetidos ao crivo do contraditório e da ampla defesa”. Ele se refere ao fato de que essas convocações do TSE foram feitas a partir de delações que, à época, ainda não tinham sido comprovadas. “Se [os delatores] não apresentarem prova, perdem a delação. Isso que ele [Herman Benjamin] trouxe para o processo é uma coisa absolutamente ilícita”, critica o advogado, acrescentando que houve uma contaminação da prova no processo eleitoral, “em razão da ilicitude lá atrás, porque aquilo ainda não era uma prova legal”.