Um novo diário do Coronel Gurgel

Geraldo Maia do Nascimento - [email protected]

Antônio Gurgel do Amaral, destacada figura nos meios públicos e sociais do Estado do Rio Grande do Norte, encontrava-se em Mossoró no dia 12 de junho de 1927. Em virtude dos boatos alarmantes da penetração de cangaceiros no solo potiguar, viajou de automóvel à Fazenda “Brejo do Apodi”, herdade da família, próxima ao lugarejo Pedra de Abelha, atual Cidade de Felipe Guerra, a fim de buscar a esposa. Fretou um carro, mas o chofer, Francisco Agripino, apelidado de Gatinho, jovem e inexperiente, e não conhecendo a estrada, saiu justamente na localidade Santana, onde Lampião e seu bando se encontravam acantonados. O carro foi parado pelo cangaceiro Coqueiro e o Coronel Gurgel foi preso até que os familiares pagassem a quantia de quinze contos de réis por seu resgate. Permaneceu cativo do bando de cangaceiros do dia 12 de junho até o dia 25 do mesmo mês. Como era de costume, foi fazendo anotações para o seu diário pessoal de tudo o que via e ouvia no bando, dos lugares por onde passou, onde acamparam e muitas outras informações sobre Lampião e seu bando.

Três anos depois, o jornal vespertino “A Notícia”, do Rio de Janeiro, em suas edições de 22, 24, 25, 26, 27, 28 e 29 de março de 1930, passou a publicar o que chamou de “O Diário do Coronel Antônio Gurgel do Amaral. Em 1955 o escritor potiguar Raimundo Nonato, em seu livro “Lampião em Mossoró”, editado pela Coleção Mossoroense – Série C – Impresso pelos Irmãos PONGETTI – Editores – Rio de Janeiro, em um de seus capítulos, com o título de “Dos jornais”, transcrevia essas reportagens do jornal “A Notícia”, mas sem dá nenhum enfoque. Em 1972 o escritor pernambucano Luiz Luna, em seu livro “Lampião e seus Cabras” usou como apêndice do seu livro o “Diário do Coronel Gurgel”. Finalmente Raimundo Soares de Brito, escritor e historiador mossoroense, resolveu dá o destaque que o Diário merecia. Publicou o livro “Nas Garras de Lampião (Diário), pela Fundação Vingt-un Rosados – Coleção Mossoroense – Série C – Volume 910 – 1996. O sucesso foi imediato, esgotando a edição rapidamente. Em 2006 foi publicada uma segunda edição, revista e ampliada, também pela Coleção Mossoroense – Fundação Vingt-un Rosado – Coleção Mossoroense – Série C – Volume 1.533 – 2006. Graças a esse diário, o Coronel Gurgel ficou bastante conhecido em Mossoró.

Certo dia recebi um telefonema de um senhor que dizia se chamar Eduardo Antônio Gurgel e que era neto do Coronel Antônio Gurgel do Amaral. Não me lembro qual foi o ano, mas sei que foi durante os festejos juninos. Disse que tinha conseguido o meu contato com um parente e que tinha uns documentos para me mostrar. Convidei-o a vir a minha casa, o que ele fez no mesmo dia.

Eduardo era Engenheiro Agrônomo e morava em Salvador/BA. Disse que era filho de Mário Damasceno Gurgel, e que tinha herdado do seu pai vários cadernos de anotações do seu avô, Antônio Gurgel, alguns do período que passou como prisioneiro do bando de Lampião e outros de uma viagem que o mesmo fez para a Alemanha.  O diário da viagem do Coronel Gurgel para a Alemanha ele tinha transformado em livro e veio pedir minha ajuda para publicar o mesmo, já que o seu avô tinha ficado bem conhecido aqui depois da publicação do livro “Nas Garras de Lampião”, de Raimundo Soares de Brito.

Antônio Gurgel era sócio de uma firma de importação e exportação de produtos para a Alemanha, sendo o seu outro sócio natural daquele país. O motivo dessa viagem, era a de reencontrar o seu filho Mário Gurgel, que lá se encontrava, e também a de conhecer aquele país, que se encontrava numa grave crise econômica causada pela Primeira Guerra Mundial.

Eduardo deixou comigo um CD com vários arquivos, incluindo fotos da família, principalmente da viagem para a Alemanha, mapas com o roteiro seguido pelo avô em sua viagem, foto do navio em que ele embarcou nessa viagem e vários outros arquivos digitados, inclusive o livro que pretendia publicar, me pedindo para fazer a apresentação. Voltou para Salvador e ficamos nos falando por telefone. Mas algum tempo depois recebi a notícia que Eduardo tinha falecido de ataque cardíaco em Salvador. Com a morte do principal interessado, esse material ficou esquecido em meu computador.

O Coronel Antônio Gurgel tinha por costume registrar em cadernos os principais momentos de sua vida. Esse diário de sua viagem à Alemanha teve início no dia 19 de junho de 1923 e foi concluído em 21 de outubro do mesmo ano. É um relato minucioso de cada etapa da viagem. No último registro, em 21 de outubro, diz: “Termino aqui o diário de minha viagem à Alemanha, dando graças a Deus por ter gozado de boa saúde e ter chegado em paz. “

Assim terminava a saga da sua viagem para a Alemanha.

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