Tomislav R. Femenick: A República das Melancias

A pesquisadora Célia Caldas, pós-doutorada pela Universidade de Jönköping, na Suécia, usando elementos da física quântica, explicar que “todo átomo é composto de 99,9% de espaço vazio e as partículas que se movem neste espaço são feixes de energia que carregam informação. [Por cauda disso] Cada célula é consciente de como você pensa e como se sente”. Se isso é verdade, só nos resta acreditar que no Brasil de hoje há uma crise de conectividade entre as informações que as células possuem. As nossas autoridades parecem que se blindaram contra qualquer espécie de consciência. O que a elas interessa é tão somente aparecer na mídia, ser notícias, nem que para isso sejam objetos de ridículo e da execração pública. O recato desapareceu, a cautela sumiu, a moderação se escafedeu.

O Congresso Nacional é o palco maior dessa tragicomédia verde-amarelo. Lá cada ator é um arlequim, um bufão sem graça, um farsante, se não um palhaço sem medo de assim ser. Termos os bolsonaros, os jeans willys, os caiados, os renans, os maias e toda a tropa de choque da esquerda, com os lindbergs, os fátimas, as gleisis e companhia. Isso para não falar do baixo clero que tudo faz para aparecer, nem que seja escorregando em uma casca de banana. No fundo no fundo, todos pensam na reeleição. Quer algo mais constrangedor que a votação do impeachment na Câmara Federal? Cusparada, exaltação a torturadores, mentiras desvairadas e “otras cositas mas”. Comprometeram até os filhos, netos, parentes e aderentes.

No executivo temos uma plêiade que mescla comprometimento com a república de Curitiba, farsas circenses e desacertos, em que despontam ora os jucás, os geddeis, os francos. No mais o governo Temer é refém do Congresso, do qual precisa para aprovar as reformas das quais o país necessita para voltar a entrar nos eixos. Todo deputado, todo senador tem um pleito junto ao governo; no mais das vezes um cargo para um familiar ou apaniguado político. O resultado é um embaraço geral. Até quando estão certos, tomam atitudes erradas. O exemplo maior foi a saída de Marcelo Calero do Ministério da Cultura. Deixou a diplomacia de lado (ele é diplomata de carreira) e agiu como a vestal das vestais e, clandestinamente, gravou uma conversa com o presidente da República. Dizem que hoje procura um partido para se candidatar a deputado federal.

A nossa esperança era a Justiça; reforçada pela atuação do juiz Moro, dos procuradores e da Polícia Federal do Paraná. Lá tudo dava certo e seu exemplo estava sendo refletido pelo país. Além do mais já tinha havido o celebre julgamento do mensalão; mesmos com os casos de estrelismo e histrionismo, protagonizados por um ou outro ministro. Mas as coisas começaram a mudar de forma radical. O venerável Joaquinsão se aposentou antes do tempo e passou a dar palpites (quasem sempre infelizes) sobre tudo e todos – mas se cala quando se fala no seu apartamento comprado em Miami através de uma offshore. O ministro Ricardo Lewandowski endossou o fatiamento do processo de impeachment de Dilma; ou seja, aceitou mudar a Constituição sem que ela tivesse sido alterada. Seu colega Marco Aurélio Mello resolveu, de forma monocrática, individual, afastar o presidente do Congresso. Deu no que deu: uma balbúrdia danada; nem o vice do senado aceitou, embora seja do PT. O jeito foi dar um jeitinho a lá brasileira e tudo ficou quase como estava. A última foi do Ministro Luz Fuz; resolveu, também de forma monocrática, anular todo um processo de votação já havida na Câmara Federal e encaminhada ao Senado. Pelo que eu sei um dos princípios basilares de nossa Constituição é a independência dos Poderes. Vamos ver o que isso vai dar. Parece que todos estão ancorados em um outro mundo que não este em que vivemos; sem qualquer dimensão geográfica e histórica com este Brasil empobrecido e com pobres expectativas para o futuro.

O termo “Republica das Bananas” era muito comum no século passado para identificar países sem governo próprio, pois eram títeres de outras potências. Este não é o nosso caso. Por comparação somente, têm-se a impressão que a nossa pátria se transformou em uma imensa República das Melancias, onde quase todas as autoridades somente pensam em si e querem aparecer na foto, mesmo que para isso tenham que pendurar uma melancia no pescoço e deixem um rastro de excrementos por onde passam. Parece até que ninguém tem consciência de como pensa e de como se sente.

Nesta terra que Cabral nos legou, até tese de pós-doutorado é solenemente desacatada. Suas excelências preferem chafurdar na lata do luxo.

Tomislav R. Femenick – Mestre em economia, com extensão em sociologia e história.

Tribuna do Norte. Natal, 21 dez. 2016