TOMEI CAFÉ COM GOLBERY

Tomislav R. Femenick – Jornalista e Mestre em Economia, pela PUC-SP.

O general Golbery do Couto e Silva é conhecido como um dos principais teóricos da doutrina de segurança nacional, elaborada nos anos 50 pela Escola Superior de Guerra, sendo um dos criadores do Serviço Nacional de Informações (SNI). No final da Segunda Guerra Mundial, em 1944, ele serviu na Força Expedicionária Brasileira (FEB), como oficial de inteligência. Seu envolvimento com a política data de 1955, quando lançou seu livro “Planejamento Estratégico”. Porém sua participação mais direta nas discussões nacionais se deu a partir de 1960, quando apoiou a candidatura de Jânio Quatros à presidência da República.

Após passar para a reserva militar, passou a atuar contra a presença do comunismo no país. Foi o principal teórico do movimento que resultou no Governo Militar de 1964, durante o qual foi Chefe do Serviço Nacional de Informações (1964-1967), Ministro do Tribunal de Contas da União (1967-1968), Ministro-chefe da Casa Civil do Brasil (1974-1978 e 1981), Ministro do Planejamento (1979) e Ministro da Justiça (1980).

Discordando dos militares “linha dura”, a partir de 1974, passou a lutar pela abertura política do país. Foi sua a ideia da reforma partidária de 1979, que extinguiu o bipartidarismo, e deu margem à criação de novos partidos políticos. Suas posições de estrategista do golpe e da abertura política lhe granjearam o apelido de “o bruxo”.

Duas vezes eu morei em São Paulo. A primeira vez, em 1963, foi um rápido período de tempo, menos de dois anos. Foi quando eu conheci José Vasconcelos de Alencar, então diretor da Corretora Pires Germano. Fui convidado a trabalhar com ele, como seu assistente. Na segunda vez em que fui para a pauliceia, em 1972 – desta vez morei por quase quarenta anos – novamente fui trabalhar com o meu amigo Alencar, também como assistente da diretoria, mas, desta vez, no Banco Cidade. Ele era um executivo aberto às novas ideias e queria incorporar ao banco as inovações aplicadas pelo Banco do Nordeste, do qual eu tinha sido funcionário, por mais de doze anos. O Banco Cidade tinha uma filial em Nova Iorque, o Commercial Bank, e era controlado pelos seus sócios majoritários Edmundo Safdié e Isaac Harari, os quais eram associados com o grupo norte-americano Dow Chemical, que na época era dirigido no Brasil por, nada mais nada menos, Golbery do Couto e Silva.

Pelas funções que eu exercia no Banco e, também, pela aproximação que eu tinha com Alencar, minha mesa de trabalho ficava na mesma sala ocupada por ele. Ali eram recebidos os grandes clientes, eram realizados os grandes negócios; algumas vezes em português; outras em inglês, francês, hebraico, árabe e outras línguas menos cotadas, em torno de uma grande mesa redonda. Sempre com a presença de um tradutor.

Geralmente eu chegava cedo, antes de começar o expediente para o público. Um dia, ao chegar para trabalhar, encontrei dois seguranças na porta. Só entrei depois que viram meu crachá. Lá dentro encontrei um homem comum, de aparência afável, estatura comum, idade mais ou menos média e semblante sorridente. Antes de me apresentar, o cidadão disse que estava esperando o “Sr. Alencar” e desculpou-se por ter chegado cedo demais. Como era natural, ficamos conversando. Ele disse que meu sotaque mostrava que eu não era paulista. Respondi que era potiguar. Ele então revelou que tinha visitado as salinas de Mossoró e conhecido um padre, que tinha sido prefeito da cidade por quase dez anos. Eu respondi que o padre era meu tio.

A essa altura o cidadão, que espera o meu chefe, se dirigiu a uma mesinha onde ficava a garra de café, perguntou se eu também queria. Serviu duas xícaras, uma para ele e outra para mim, trouxe ambas até minha mesa, sentou-se em uma cadeira. Tomamos café jogando conversa fora. Falamos sobre o tempo, o trânsito e outras coisas sem importância. Poucos minutos depois, Alencar chegou. Sai da sala e fui conversas com outros funcionários. Só aí é que eu soube que o cidadão afável era o célebre general Golbery do Couto e Silva.

Deixe um comentário