Serviço de WhatsApp atende mulheres vítimas de violência sexual

Apesar do empoderamento e das bandeiras levantadas pelo movimento feminista, ainda é grande o número de mulheres vítimas do machismo e do sexismo, que faz com que homens se sintam autorizados a tocá-las, abusá-las e muitas vezes até matá-las.

De acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2019, foram registrados 66.041 casos de violência sexual em 2018. Deste total, 81,8% das vítimas eram do sexo feminino, 53,8% tinham até 13 anos e 50,9% eram negras.

Muitas das vítimas desse tipo de violência não procuram assistência imediata, o que levou o Grupo Curumin, de Pernambuco, a criar uma campanha permanente de apoio para orientar as mulheres que passam por situações de violência sexual.

O atendimento é feito por WhatsApp (81 98580-7506) e oferece orientações com embasamento técnico, científico e jurídico.

Atendimento para vítimas de violência sexual

Paula Viana é enfermeira e uma das coordenadoras do grupo, organização não governamental feminista que desenvolve projetos de fortalecimento da cidadania das mulheres.

Ela explica que as primeiras horas após sofrer um estupro ou abuso sexual são de fundamental importância para um tratamento seguro que evite doenças sexualmente transmissíveis e gravidez imprevista.

“Adolescentes vítimas de violência sexual podem engravidar. Então, se ela ela chegar no serviço de saúde até 72 horas após o ocorrido, ela pode evitar a gravidez decorrida desse estupro e evitar riscos sérios à saúde física e à saúde mental. Alguns cuidados com a saúde são importantes para prevenir doenças sexualmente transmissíveis, como a Aids e hepatites”, reforça.

De acordo com a última Pesquisa Nacional de Vitimização, estima-se que apenas 7,5% das vítimas no Brasil realizam registro policial.

Mesmo com a baixa notificação, os dados da polícia ainda são três vezes maiores do que os levantados no Sistema de Notificação de Agravos (SINAN) do Ministério da Saúde, referentes aos serviços de saúde que atendem a população.

“No Brasil, a maioria são meninas em torno dos 10, 13 anos, negras são as mais vulneráveis. No caso de abuso, a primeira providência é ir para um serviço de saúde. Não vá pra delegacia. Delegacia é um segundo passo, pode ser importante também, mas é um segundo passo”, ressalta Viana.

A violência sexual, o estupro e o aborto

Aproximadamente 80% das vítimas de violência sexual são mulheres, mais de 50% tem menos de 13 anos. Segundo dados de 2018, da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), ligada à Organização Mundial da Saúde (OMS), a gravidez na adolescência é um grave problema de saúde pública no Brasil.

Enquanto a taxa mundial é estimada em 46 nascimentos para cada mil meninas entre 15 e 19 anos, no Brasil são 68,4 nascimentos para cada mil jovens. No  Brasil, o aborto só é permitido em três casos: risco de morte para a mulher; bebê anencéfalo; gestação decorrente de violência sexual. Fora disso, o aborto é considerado crime.

A psicóloga Crissia Cruz explica que os agentes de saúde e as pessoas envolvidas no processo de atendimento à mulher vítima de violência sexual é carregado de um tecido social que diz que o aborto é crime, que é pecado, que é errado fazê-lo.

“Todas essas crenças e valores acabam sendo entranhados na própria formação dos profissionais de saúde, que também são pessoas que circulam nessa sociedade que têm seus valores. E tudo isso atravessa o próprio serviço da mulher vítima de violência sexual. Todo esse julgamento em relação à decisão de se fazer esse aborto”, afirma.

Outro ponto que a psicóloga Crissia Cruz destaca é que o estupro não é uma relação sexual, mas sim uma violência sexual. O que diferencia é, justamente, a questão do consentimento.

“Os estudos vão mostrar que a violência sexual está relacionada a uma relação de poder, a uma relação de dominação desse corpo feminino. Dessa objetificação do corpo feminino. Muito mais do que um desejo sexual incontrolável”, esclarece.

Mesmo com os dados alarmantes de violência sexual, Crissia Cruz lamenta que a política pública caminhe para um discurso perigoso como o defendido pela ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, que se posiciona – claramente – contra o aborto mesmo em caso de estupro.

“Quando você tem uma figura de autoridade como uma ministra, que vai estar sempre reforçando esses estereótipos de que o aborto é pecado, de que é errado, mesmo nos casos de violência sexual, isso reforça ainda mais esses discursos baseados em valores morais e religiosos que acabam dificultando a própria lógica do serviço e dificultando que as mulheres cheguem ao serviço”, afirma.

 

Agência Brasil