Robinson procurou informações sobre investigação na AL

Uma interceptação telefônica feita pelo Ministério Público e divulgada nesta terça-feira pelo portal G1/RN e InterTV Cabugi, confirma que o governador Robinson Faria (PSD) buscou informações sobre a investigação que resultou na operação Dama de Espadas, deflagrada em agosto de 2015.

O áudio foi captado em agosto de 2014, quando Robinson era candidato ao governo. Na gravação, ele conversa com a então procuradora-geral da Assembleia Legislativa, Rita das Mercês Reinaldo acusada do suposto desvio de R$ 5,5 milhões da Casa.

Robinson foi presidente da Assembleia Legislativa entre 2003 e 2010. Durante este período, Rita, que já era procuradora-geral, manteve-se no cargo.

Às 16h17 de 26 de agosto, Robinson ligou para Rita questionando sobre o fato de algumas pessoas que trabalhavam lá estarem sendo intimadas para depor ao Ministério Público.

A transcrição de trechos do telefonema, obtida junto ao site G1/RN segue abaixo:

ROBINSON – (…) O que é que você está achando disso ai? É o que?

RITA – É. A gente tá trabalhando, né? O presidente tá trabalhando. Já trabalhou já hoje, certo?

O “trabalho” seria uma conversa entre Ricardo Motta e o procurador-geral de Justiça do RN, Rinaldo Reis presenciada por Rita na manhã do mesmo dia 26 de agosto.

RITA – (…) Eu dei a entender hoje na hora da reunião lá que não era interessante pra ele lá, porque agora um negócio que está para prescrever, né? (…) Ele disse: ‘vou procurar me inteirar e tal’. Eu disse: ‘inclusive você viu, você estava na minha sala semana passada quando chegou e eu mostrei e tal’. Aí ele disse: ‘Não. Eu vou procurar me inteirar e tal. Não é o momento. Vou reunir com o pessoal. Vou conversar, porque não é o momento. Vou conversar’.

Em outro trecho da conversa, Robinson procura qual época seria a investigação do Ministério Público.

ROBINSON – (…) É avulso? Ou é de um período só, ou uma certa época?

RITA – Avulso. Avulso.

ROBINSON – Tem atual e atrasado ou de época só? Ou certa época?

RITA – Tem só atrasado, só de atrasado. Tem gente já exonerado, entendeu? Tem gente efetivo. Tem aposentado, sabe? Fizeram uma miscelânea lá.

Em outro trecho da ligação, Rita das Mercês reforça que seria difícil o MP prosseguir com a investigação ou deflagrar operação em 2014. Ela volta a citar a reunião entre Ricardo Motta e Rinaldo Reis.

RITA – (…) Como o presidente colocou, ia ficar mal para a própria instituição, né?

ROBINSON  – Sim.

RITA – Ser usada pra isso…

ROBINSON – E… e não pode fazer nada à revelia do chefe, do diretor?

RITA – É, ele disse que ia conversar e tal, que eles têm independência. Mas eu acho que ele tem um pouco de influência.

ROBINSON – Tem, tem. Ele é de lá.

RITA – Ele é de lá. (…) Eu acho que ele tem um pouco de influência.

A conversa entre Robinson e Rita, que dura quase 10 minutos, é concluída com ele dando a certeza que seria eleito governador do Rio Grande do Norte.

ROBINSON – Vamos ver, né? E a outra parte aqui vai dar certo, viu?

RITA – Vai dar certo! Se Deus quiser.

ROBINSON – Vai dar certo, vamos ganhar, viu?

RITA – Vamos embora, vamos ganhar. E outra coisa: eu não quero mais ficar na Assembleia não (risos).

ROBINSON – (Risos) Vamos comigo, eu vou tirar você dai.

 

– Operação ocorreu um ano após interceptações telefônicas

A operação “Dama de Espadas” foi deflagrada um ano após as interceptações, em 20 de agosto de 2015

Rita das Mercês e a assessora dela, Ana Paula Macedo de Moura foram presas e soltas três dias após, por decisão do Tribunal de Justiça. A ação investiga suposto esquema de desvios de recurso na Assembleia Legislativa do RN.

Segundo investigação do Ministério Público, os envolvidos utilizavam cheques salários como forma de desviar recursos em benefício próprio ou de terceiros. Os cheques eram sacados, em sua maioria, pelos investigados ou por terceiros não beneficiários.

Uma outra interceptação feita pelo Ministério Público às 9h37 de 27 de agosto de 2014, mostra o ex-presidente da Assembleia Legislativa, Ricardo Motta, interessado em saber o motivo das intimações emitidas a servidores da casa. Ele ligou para Rita e pediu que ela contatasse o procurador-geral de Justiça, Rinaldo Reis, pedindo um posicionamento sobre a investigação.

MOTTA – Ei, mais tarde dá um toquezinho pra Rinaldo pra saber se ele tem alguma posição. Quando ele quer as coisas ele liga pra gente.

RITA – É. Mas não ligou. Não deu retorno.

MOTTA – Mais tarde você liga, mais no final da manhã. ‘Rinaldo, tem alguma posição?’ Entendeu?

Na mesma época em que era procurado por Rita das Mercês, Rinaldo Reis buscava  informações sobre o andamento e a votação de um projeto de lei encaminhado por ele para apreciação da Assembleia Legislativa.

Às 10h20 de 25 de agosto, o procurador telefonou para Rita e perguntou sobre o projeto, que muda a forma de indicação de desembargadores do Tribunal de Justiça pelo Ministério Público.

RINALDO – (…) Ritinha, é rápido. Você sabe dizer se está realmente pautado? Eu tentei até falar com Israel agora, mas ele não atende o telefone.

RITA – Pronto. Eu saí agora de uma reunião com o presidente e ele e está com o relator Kelps [Lima, deputado estadual]. Aí até o presidente insistindo pra levar (…) o processo amanhã pra reunião da comissão e perguntou se você tinha conseguido falar com os líderes. Conseguiu falar com alguém?

RINALDO – Não. Eu vou ligar. Eu tentei, eu tentei falar com todo mundo semana passada, mas era todo mundo com o telefone desligado.

RITA – Desligado, né?

RINALDO – Agora mesmo tentei falar com Hermano [Morais, também deputado estadual] e não consegui, que era pra saber já de alguma novidade.

Rita lembra que os deputados, estavam na fase final da campanha eleitoral:

RITA – Porque nesse período é complicado a gente botar esse povo aqui dentro, né?.

RINALDO – Eu sei. Eu sei.

Um dia após, Rinaldo volta a telefonar para Rita das Mercês, dizendo que estaria na Assembleia Legislativa. A interceptação foi feita às 9h15:

RINALDO – Estou aqui na sua casa já. Na sua casa de trabalho, entenda.

RITA – Já? Oh, coisa boa! Que maravilha (…)

RINALDO – Você está por aqui, Ritinha?

RITA – Tô. Você está em cima, na Comissão?

RINALDO – Não, não. Eu estou aqui na… Não, não tem ninguém na CCJ, eu queria saber se a gente tinha como localizar Kelps, Hermano alguns desses aí antes da gente começar.

Às 9h46, Rita recebe telefonema de um servidor da AL responsável pelos trâmites burocráticos.

SERVIDOR – (…) O ofício do Ministério Público eu queria saber se…

RITINHA – Você não subiu pra Comissão ainda não?

SERVIDOR – (…) é preciso ser lido?

RITINHA – Não. Encaminhe do presidente diretamente para a CCJ.

SERVIDOR – Tá.

RITINHA – Encaminhe agora porque essa matéria vai entrar na discussão agora.

Segundo o site da Assembleia Legislativa a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovaram a mudança na lei na manhã do telefonema. Horas depois, o projeto foi enviado ao plenário da Assembleia e aprovado à unanimidade.

Com a mudança na lei, desde aquela data, os promotores de Justiça de 3ª entrância podem ser indicados pelo MP para ocupar vaga de desembargador do Tribunal de Justiça. Antes, apenas os procuradores poderiam ser indicados.

 

– Citados em gravações se posicionam

Antes da veiculação das gravações pelo site G1/RN e pela Inter TV Cabugi, os citados foram procurados pelas equipes de reportagens e se pronunciaram sobre as gravações.

 

Veja o posicionamento de cada um deles.

– ROBINSON FARIA

O governador emitiu nota através da Assessoria de Comunicação do Governo do Estado com o seguinte conteúdo:

‘O governador Robinson Faria não foi citado pelo Ministério Público Estadual como parte nas investigações da Operação Dama de Espadas.

Tendo sido deputado estadual por 24 anos, e chegado a presidência do Legislativo, Robinson Faria conviveu e estabeleceu laços de amizade e respeito com vários servidores da Assembleia.

A relação do governador com o MPRN é de profundo respeito e diálogo por defender a contribuição essencial da instituição para a Democracia brasileira’.

O deputado Ricardo Motta, por telefone, disse não se recordar do que se tratava a conversa que teve com Rinaldo Reis e Rita das Mercês. “Como presidente da Assembleia, sempre procurei conversar com todas as instituições. Mas não me lembro do teor dessa conversa especificamente”. Indagado se tinha procurado saber do que se tratava a investigação do MP, ele negou. “Nunca procurei o doutor Rinaldo Reis para saber de investigação alguma do Ministério Público”.

 

– RINALDO REIS

“Encontrei o deputado Ricardo Motta por duas ou três vezes pessoalmente na Assembleia nessa época. Ele me perguntou do que se tratava esse inquérito civil e eu disse a ele que não sabia, até porque os promotores têm sua independência em qualquer investigação. Realmente disse que iria procurar me inteirar e assim o fiz. Perguntei à promotora responsável pelo caso do que se tratava e, à época, nem mesmo ela tinha nada de concreto, informando que se tratava de algumas possíveis irregularidades. Passei esse conteúdo para o deputado Ricardo Motta, até porque não havia nada de mais. Jamais eu passaria se a investigação estivesse avançada e em nenhum momento sugeri que ela fosse protelada. Ninguém nunca me pediu para travar nenhuma investigação, até porque não encontraria espaço para isso comigo”.

Sobre o fato de procurar os deputados Hermano Morais e Kelps Lima para tratar da aprovação do projeto de lei, Rinaldo destacou ao G1RN ser um procedimento normal.

“Isso é normal, legal e não acho que seja antiético. Na condição de procurador-geral de Justiça, sempre conversei com os deputados para esclarecer projetos de interesse do Ministério Público”.

 

HERMANO MORAIS

“Sempre que havia algum projeto do MP na Casa, o doutor Rinaldo se apresentava pessoalmente para explicar do que se tratava, mas sempre mantendo a ética. Ele chegou até a participar de reuniões na CCJ conosco”.

 

KELPS LIMA

Através da assessoria de imprensa, o deputado Kelps Lima disse ao G1 que em “todas as sessões, os deputados relatores são procurados pelas mais diversas entidades pedindo agilização de projetos: TJRN, Governo, MP, TCE, Sindicatos, OAB, ONGs. Nenhum projeto foi aprovado pela Assembleia em 2014 sem passar pelo menos na CCJ, apesar do regimento autorizar a aprovação direta sem nenhuma Comissão, desde que acordada pelos líderes”.

 

RITA DAS MERCÊS

A ex-procuradora não foi localizada. Por telefone, o advogado dela, Flaviano Gama, disse que só vai se pronunciar nos autos do processo.