Riqueza da produção de frutas no Brasil não chega à mesa de quem planta

O Brasil é o terceiro maior produtor de frutas do mundo, mas a riqueza gerada por essa cadeia produtiva,que alcança R$ 40 bilhões por ano, não chega às mãos e à mesa de quem trabalha nas plantações. Essa é uma das constatações do relatório “Frutas doces, vidas amargas”, lançado pela Oxfam Brasil nesta quinta-feira (10).

O estudo retrata as condições de vulnerabilidade econômica dos trabalhadores envolvidos na produção de melão, uva e manga no Nordeste do país, muito em função do regime de trabalho temporário relativo ao período da safra das frutas.

A situação atinge trabalhadores do Vale do Rio São Francisco e das divisas entre os estados de Bahia e Pernambuco e Ceará e Rio Grande do Norte.

O estudo será usado para uma campanha da Oxfam para que as grandes redes de supermercados assumam “um papel de liderança junto a seus fornecedores”, no sentido de garantir que “as frutas vendidas aos consumidores sejam plantadas e colhidas de forma a contribuir para a dignidade de quem as produz”.

A campanha é dirigida especificamente para Carrefour, Pão de Açúcar e Grupo Big (ex-Walmart), que controlam 46,6% do setor, segundo o Anuário da Associação Brasileira de Supermercados (Abras). Segundo a Oxfam, os três possuem grande influência na cadeia produtiva de alimentos frescos e deveriam ampliar seus critérios de certificações origem, incluindo as condições de trabalho dos agricultores e as respectivas remunerações.

Dados do Ministério do Trabalho mostram que, em 2017, as plantações de uva, melão e manga do Nordeste empregaram 88 mil pessoas. Para metade delas, o serviço não durou mais do que seis meses – devido à sazonalidade das safras, que geralmente empregam por períodos de 30 dias, três meses ou seis meses.

Na produção da manga, em 2017, por exemplo, 53,5% dos 22.172 contratados foram demitidos antes do fim do ano. No melão e na uva, foram 47% e 49,8%, respectivamente.

Segundo levantamento da própria Oxfam, a remuneração nas plantações vai de um salário mínimo a um salário mínimo e meio – com o que, se a pessoa trabalhar apenas seis meses por ano, terá uma renda mensal máxima de cerca de 700.

“A situação na fruticultura está muito aquém de um valor que seria de um salário minimamente digno, que permitiria guardar um pouco, um pouco de lazer. Essa não é a realidade que temos hoje. A realidade que temos são as pessoas fazendo escolha entre comprar remédio e comida no final do mês”, assinala Gustavo Ferroni, coordenador de pesquisa da Oxfam.

Para as mulheres que trabalham com empacotamento e limpeza, o cenário é pior, já que os contratos são ainda mais curtos, segundo a Oxfam.

Supermercados

Ferroni afirma que a responsabilidade dos supermercados em relação às condições de trabalho é fundamental para que haja uma mudança da vida dessas pessoas.

Hoje as redes já desenvolveram certificações sobre a origem dos produtos, mas, segundo Ferroni, variáveis como a superexploração da mão de obra na lavoura não entram na avaliação.

Um dos caminhos apontados pelo estudo é engajar os sindicatos rurais na elaboração das certificações.

“Os sindicatos de trabalhadores rurais da fruticultura desejam ser envolvidos ativamente nos processos de governança das cadeias produtivas, o que significa entender e participar dos processos de certificação, sejam de terceira parte ou dos próprios supermercados. O monitoramento socioambiental não deve ser feito somente entre o supermercado e seu fornecedor”, diz o documento.

 

Edição: Rodrigo Chagas e João Paulo Soares

Agência Brasil