Pressão estética, ditadura da beleza e ataques virtuais: o que as críticas ao corpo de Paolla Oliveira – e a reação em defesa da atriz – revelam

Especialista em doenças da beleza explica que os padrões impostos pela sociedade impactam a saúde física e mental de mulheres. No entanto, aumento da diversidade traz esperança.

Portal g1

A atriz Paolla Oliveira é o exemplo mais recente de mulher famosa atacada nas redes sociais por causa do corpo. Ela se junta a uma extensa lista de vítimas de hate – onda de comentários agressivos on-line – ao longo de 2023: Viih Tube e sua bebê, Jojo Todynho, entre outras, também foram alvo de ataques virtuais.

O mecanismo, segundo especialistas, é parte da pressão estética que afeta a saúde física e mental de mulheres. Apesar do cenário sombrio, há uma luz no fim do túnel: cada vez mais, as mulheres têm desafiado os padrões impostos pela sociedade, e os agressores não têm passado impune dos linchamentos virtuais.

“Antes, isso não existia. Hoje, temos uma resposta e regulação social contra esse tipo de preconceito.”
— Joana Nunes, psicanalista e coordenadora do núcleo de Doenças da Beleza da PUC-Rio

Paolla Oliveira e a liberdade do corpo

 

Na última semana, a atriz compartilhou nas redes um vídeo de um ensaio na escola de samba Grande Rio, onde vai sair como rainha de bateria. Aos 41 anos, essa é a sexta vez que Paolla ocupa o posto na escola – um recorde. No entanto, o vídeo, que tem 6 milhões de visualizações, gerou uma onda de ataques. O motivo? sua idade e o seu corpo real e sem retoques.

A psicanalista e coordenadora do núcleo de Doenças da Beleza da PUC-Rio Joana Novaes explica que os comentários e a violência são o retrato da prisão estética a que os corpos femininos estão submetidos.

“A mulher está presa à manutenção do corpo assim como ela esteve historicamente presa à maternidade e ao casamento. E esse padrão é uma prisão. Uma estrutura de controle já que não podemos, socialmente, estar engajadas em outros projetos que não o da beleza.”
— Joana Novaes, psicanalista

💪 Paolla não respondeu aos ataques, mas a onda de violência foi revidada na mesma intensidade por mulheres que se uniram para comentar e compartilhar o vídeo questionando a atitude violenta dos haters, e fazer elogios à atriz.

Também houve posicionamentos de outras mulheres famosas — o que mostra uma forma de organização em proteção contra esse tipo de comportamento.

Viih Tube e a cobrança do corpo pós-maternidade

 

A influenciadora Viih Tube, que tem 22 anos e foi mãe no início deste ano, também foi alvo de hate por conta do seu corpo.

A ex-BBB usa as redes sociais para compartilhar conteúdo de maternidade e, recentemente, fez vários vídeos mostrando o seu corpo real pós-parto. Ela também tem compartilhado sua relação com sua nova forma física pós-maternidade.

Viih Tube rebate seguidores após cobrança por lipo após maternidade — Foto: Reprodução/Instagram

Ao longo do processo, ela foi criticada pelo sobrepeso e recebeu vários comentários questionando o motivo de não ter se submetido a lipoaspiração – cirurgia plástica para a retirada de gordura – para acelerar o emagrecimento após o parto já que teria condições financeiras.

A influenciadora chegou a rebater os posts dizendo que isso não estava nos planos e relembrou que foi mãe há apenas poucos meses.

Lua, filha de Viih Tube e Eliezer — Foto: Reprodução/Instagram

Lua, filha de Viih Tube e Eliezer — Foto: Reprodução/Instagram

 

A filha de Viih Tube, Lua, também foi sofreu comentários maldosos sobre o seu padrão de corpo.

Com menos de um ano de idade, ela tem sua rotina compartilhada nas redes pela mãe, que contou receber comentários como: “Do que adianta nascer rica, mas ser obesa?”; “Tinha tudo pra ser linda, mas é obesa. Tadinha” e “Ela vai explodir”.

A banalização do risco

 

👉 O padrão é cíclico. Em dez anos, por exemplo, as irmãs Kardashians passaram de um símbolo de corpo curvilíneo para um modelo mais magro. Ou seja, a moda passa,mas é difícil submeter o corpo a tantas mudanças, o que torna os padrõesinalcançáveis.

Segundo a especialista, a pressão estética custa a saúde mental das mulheres com doenças como distorção de autoimagem, transtornos alimentares, depressão e ansiedade.

Além disso, isso se reflete na banalização de procedimentos, cirurgias e remédios que colocam em risco à saúde e podem levar à morte.

🚨 Recentemente, uma jovem de 24 anos teve de ser hospitalizada depois de colocar um “chip da beleza” turbinado com ocitocina, conhecida popularmente como hormônio do amor. A promessa do chip, quer é proibido pela Anvisa, era de que a ocitocina ajudaria no emagrecimento – o que não tem qualquer comprovação científica.

🚨 O uso massivo de canetas desenvolvidas para o tratamento de diabetes com o objetivo de perder peso. Recentemente, a Anvisa chegou a emitir um alerta sobre lotes falsos dos medicamentos circulando no mercado.

🚨 E os casos frequentes de pacientes mortas em salas de cirurgia em razão de procedimentos estéticos.

A psicanalista Joana Novaes explica que isso é ainda mais intenso quando falamos de mulheres famosas, já que o poder aquisitivo e a fama trazem consigo a cobrança para que mantenham o corpo dentro do padrão esperado.

“Elas podem pagar por procedimentos, independentemente dos riscos. Então, [na cabeça da sociedade,] não há justificativas para não estarem magras e jovens. Não importa que isso lhes custe a saúde. Não importa os planos, os desejos. Não há nada mais importante do que o investimento no corpo e na aparência. A mulher que não faz esse tipo de investimento é tida como incapaz, incompetente”.

Jojo Todynho e a bariátrica

 

Jojo Todynho tem 28 milhões de seguidores e é conhecida pelo conteúdo sobre empoderamento do corpo gordo. Nas redes, sempre falou sobre ser uma pessoa gorda e se aceitar. A artista chegou a pesar 140 quilos.

Neste ano, a influenciadora decidiu fazer cirurgia bariátrica — uma intervenção cirúrgica para ajudar pessoas com obesidade na perda de peso – por recomendação médica. Ela disse que deseja ser mãe, já vinha se exercitando para a perda de peso e decidiu com o médico pela bariátrica.

Após contar que havia feito o procedimento, recebeu uma onda de hate questionando a decisão.

Meses depois, recebeu uma nova onda de comentários sobre seu corpo, mas agora questionando por que não tinha perdido peso, aparentemente, após a cirurgia. “Bariátrica não é lipo”, respondeu a um seguidor nas redes. (Veja a imagem abaixo)

Jojo Todynho rebate seguidor que questionou a rapidez de sua perda de peso pós bariátrica — Foto: Reprodução/Instagram

Jojo Todynho rebate seguidor que questionou a rapidez de sua perda de peso pós bariátrica — Foto: Reprodução/Instagram

 

 

Há esperança?

 

Paolla, Jojo Todynho, Viih Tube e sua bebê não são as únicas vítimas de hate por seus corpos e essa prática ainda vai seguir em 2024.

Visto como mercadoria por parte da sociedade, o corpo feminino tem por trás uma indústria milionária: a da beleza. No entanto, a psicanalista Joana Novaes explica que 2023 reforça uma mensagem de esperança por duas razões:

  • A crescente transgressão às regras impostas

 

Paolla não usou retoques em seu corpo. Jojo Todynho não deixou de fazer o que achava certo para si mesma e Viih Tube não escondeu seu corpo pós-maternidade. Ou seja, as mulheres estão buscando liberdade, apesar da pressão.

  • O apoio às mulheres vítimas desse tipo de violência

 

Os movimentos têm mostrado resposta defendendo mulheres e abrindo debate para a diversidade. No caso de Paolla, por exemplo, internautas se uniram para apoiá-la nos comentários dos vídeos.

O espaço de pautas identitárias com inclusão de corpos gordos, pessoas com deficiência, negras e que respeitam os corpos naturais de mulheres vem crescendo, inclusive no meio comercial.

Não estamos vendo ainda os corpos femininos livres, mas quem ataca não fica mais impune. Para cada manifestação de estigmatização e preconceito, como vimos com Paolla Oliveira, estamos vendo uma resposta. As pautas identitárias, que incluem mulheres gordas, negras, deficientes têm incomodado quem quer aniquilar o direito do outro de existir como ele é.
— Joana Novaes, psicanalista e coordenadora do núcleo de Doenças da Beleza da PUC-Rio.

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