O pianista Oriano de Almeida em seu centenário de nascimento

Gutenberg Costa – Escritor, pesquisador e folclorista

Sempre que chego em aeroportos, rodoviárias ou espaços públicos em cidades do nosso país, me deparo com homenagens retratadas em fotografias imensas de seus filhos ilustres ou daqueles que escolheram aquele chão para suas moradas. Fatos que me alegram, como mero turista cultural curioso. Lembro de duas exposições que vi com meus próprios olhos, em Recife com Gilberto Freyre e em Salvador com Jorge Amado. Por aqui no nosso RN ainda não vi, mas espero um dia ver em conjunto com meus netos, grandes painéis retratando nossos artistas e intelectuais. Suas fotos e obras em aeroportos, rodoviárias, mercados e praças. Nada me orgulha mais ser sempre lembrado em todos os lugares em que chego dessa maneira: “O senhor é do Estado de Câmara Cascudo e Nísia Floresta”. Não sabem eles que, no chão nascedouro do nosso casal ilustre e famoso, nem uma placa indicativa sequer existe em suas entradas com seus nomes. Nem uma faixa sequer…

Um turista chato cultural, como eu, sempre irá reclamar aonde quer que chegue com esses e outros descuidos, principalmente com a história de seus nomes ilustres: Aonde está a placa na casa em que nasceu o escritor ou artista? Seu nome em rua ou praça? O museu ou memorial com suas obras e pertences? Quando nada vejo, não levo recordações e faço como os antiguíssimos cristãos faziam ao saírem das cidades nas quais não encontravam respeito: batiam as sandálias para retirarem a poeira do chão amaldiçoado!

Vamos ao assunto de hoje. Eu digo que tive a felicidade de conhecer três pianistas famosos em Natal do meu tempo. No finado Café São Luiz, do Grande Ponto da Cidade Alta, vi em muitas oportunidades, conversei e tomei café com o velho Paulo Lira (1903-1979). Magrinho, branco e calvo totalmente. Saía de lá já com seus passinhos curtos devido a idade. Famoso pianista e boêmio.

Anos depois, quando tinha a minha coluna semanal no saudoso jornal Dois Pontos, fui ao antigo Hotel e restaurante Casa Grande, na Rua Princesa Isabel, entrevistar um dos últimos pianistas em restaurantes da cidade do Natal, o famoso Leonardo Dantas (1924-1999). Foi um furo jornalístico em 08 de maio de 1993. Esse não havia concedido entrevista a ninguém antes de mim. O fotógrafo acompanhante do referido jornal foi o amigo Canindé Soares, o qual registrou tocando a sua paixão, o piano. Em 1999, fez parte do meu livro ‘Natal Personagens Populares’, porém partiu antes do lançamento.

Este ano temos vários nomes com centenários de nascimentos. Por justiça e gratidão, vou falar de quem conheci e os tive por amizade. O pianista com centenário de nascimento é o saudoso amigo Oriano de Almeida. Nascido em 15 de julho de 1921 e encantado em 11 de maio de 2004. Era meu confrade no Instituto Histórico e Geográfico do RN. Fui a dois lançamentos de seus livros e sempre o via nos eventos do nosso Instituto, o qual inclusive, com justiça e gratidão, reservou um espaço para o seu memorial. Sabe-se que toda a imortalidade fica nas lembranças e homenagens, principalmente em vida. E os esquecidos, esses sim, realmente, morrem de vez!

Além de dois de seus livros com gentis dedicatórias, em nosso acervo temos um vinil, CD e fotografias. Por vários sábados, eu era convidado pelo saudoso amigo e presidente do IHGRN, Enélio Petrovich, a acompanha-lo nos inesquecíveis cafés da manhã, no hotel Sol da Cidade Alta, residência do músico Oriano de Almeida. Encontros, sempre regado a boas conversas, com presenças de vários amigos na mesa agapeana dos inesquecíveis sábados. Como era bom reunir em uma mesa café e conversas com verdadeiras amizades. Coisas tão rara, nesses tempos de distanciamento e indiferença social. Sou de um tempo no qual os amigos se encontravam em feiras, mercados, padarias ou restaurantes para compartilhamento de nossos projetos e nosso cotidiano.

Oriano de Almeida é verbete no ‘Dicionário da Música Potiguar’ da amiga escritora e pesquisadora Leide Câmara. Teve seu devido e merecido reconhecimento histórico registrado na biografia escrita pelo amigo escritor e historiador Claudio Galvão, lançada em 20 de julho de 2010, intitulada ‘O Céu era o Limite’. E quando se fez um ano de seu encantamento, em 2005, foi também lançado um CD in memoriam ao ilustre músico. Agora, em seu centenário de nascimento, esperamos e se faz necessário e justo, todas as homenagens por parte de nossas instituições culturais do RN. Vamos ter esperanças e esperar…

O pianista Oriano era nascido em Belém do Pará, mas de família no RN, entre Macau e Natal. Seu tio era o grande maestro Waldemar de Almeida (1904-1975). O mesmo além de exímio músico, era pesquisador musical, escritor e memorialista. Profundo conhecedor da música clássica mundial, conversava com muita propriedade sobre as vidas e as obras dos geniais Chopin e Debussy. Ainda assumiu a vaga de Câmara Cascudo na Academia de Letras do RN, cadeira 13. Na ocasião, foi saudado pelo grande amigo Enélio Lima Petrovich (1934-2012). Eu estava na referida solenidade e posso testemunhar que a noite de 12 de setembro de 1996, foi uma linda festa homenagem com inúmeros escritores e público em geral que ali estavam.

Em vida, Oriano recebeu diversas homenagens no Rio de Janeiro e São Paulo. E, merecidamente, recebeu comendas culturais e o título de cidadania natalense.

Aqui fica o meu singelo registro no livro das boas e ilustres amizades. Espero ter feito, embora reconheça que foi demasiadamente pouco, a minha parte nas homenagens que, com certeza, se seguirão ao meu saudoso confrade, amigo e grande pianista Oriano de Almeida.

O genial poeta e também músico, Vinicius de Morais (1913-1980) amante da liberdade, disse-nos que poucas coisas deveriam ser proibidas na vida, entre elas: “É proibido ter medo de suas lembranças!”.

E o povo está certíssimo, quando afirma nas feiras em que ando corriqueiramente que a ‘ingratidão’ é a mãe do miserável ‘esquecimento’. Para aqueles ou aquelas que ficam omissos, dizem que na história do tempo, não haverá perdão algum…

Amizades são amizades, que tenham sido por poucos anos ou por décadas. O tempo pouco importa. O que nos fica realmente, são as lembranças e as gratidões, destas.

Que seja sempre lembrado e louvado, o amigo pianista e escritor Oriano de Almeida!

15/07/2021 – Morada São Saruê, Nísia Floresta/RN.

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