O ALIENÍGENA (PARTE IV)
Clauder Arcanjo*
The Blue Room, de Picasso.
Robertão Social, dias depois, prendeu um garoto. O pobre rapazola estava em descarga onanista, mas Robertão atribuiu tal hábito a quem veio de Marte.
— Os marcianos procriam pelas mãos! — anunciou.
Quando João Américo, o protofilósofo de Licânia, soube do inusitado, deixou mais do que depressa o seu esconderijo platônico no sopé do Serrote e cuidou de fazer a defesa do suposto extraterrestre:
— Se for assim, caro investigador, todos os homens nesta querida província vieram de Marte. Quem não foi, ou ainda é, punheteiro que atire a primeira pedra! Digo, a primeira condenação.
O senhor prefeito, que se servira das próprias carnes quando em sua juventude, apressou-se a libertar o assustado rapazola.
— Vai-te e não faças isso mais, que acaba te gerando uma fraqueza daquelas! Sei disso porque ainda me lembro da tosse braba que arranjei.
João Américo, sempre acompanhado de seus compêndios, aprofundou o colóquio com Robertão Social. Não foi difícil descobrir a cartilha em que rezava aquele ufo-detetive.
— Com isso aí, suspeito, você será motivo de troça — advertiu-o.
A cartilha do Robertão era o livro Eram os deuses astronautas?, de Erich von Däniken. Considerado por João Américo um tomo repleto de achados superados.
O secretário de finanças de Licânia, que havia assinado um contrato astronômico com Robertão, tangeu o protofilósofo de volta para o sopé do Serrote da Rola, alegando que haveria uma reunião extraordinária do gabinete de crise, a fim de decidirem as ações emergenciais necessárias para o enfrentamento do conflito.
— Que conflito, se vocês fugiram? — intrometeu-se Gazumba.
— Cabo Jacinto! Cuide de levar o Gazumba. Recolha-o e enquadre-o na Lei de Segurança Sideral — ordenou o Lau, recém-nomeado chefe de gabinete, devido à vacância do cargo com o sumiço do ocupante anterior.
Em Licânia, caros leitores, quando um admirador da cachaça é ameaçado, instala-se um clima de guerra. E com a ordem de prisão proferida contra o Gazumba, a coisa não foi diferente.
Não se sabe de onde tanta gente saiu, mas a verdade é que, num piscar de olhos, mais de uma vintena de cachaceiros fechou o cerco, evitando a saída do Gazumba.
— Um por todos, todos por uma… Digo, por um! — bradou Zé Aguiar, à frente dos amotinados.
João Américo, afeito à retaguarda de qualquer conflito, subsidiava os insurrectos com as palavras de ordem:
— Alea jacta est!, digam agora todos.
— Alheia a jaca é!
O nível de álcool estava muito alto no juízo da legião de pinguços. Aquilo que saiu da boca deles foi algo de fazer Roma cair, quanto mais Licânia.
— Bando de ignorantes! Desrespeitaram o legado de Júlio César — disparou João Américo.
— Aí dentro!
— Quem foi que disse isso? Se for homem, apresente-se! — gritava colérico o protofilósofo, abandonando a posição de retaguarda e partindo para a frente de combate.
Nisso, um uivo arrepiante rasgou a mataria:
— Auuuuuuu… Auuuuuuu… uuu…
& & &
“E o que se deu depois, seu narrador?”
E eu lá sei! Não ficou ninguém para me relatar o que se seguiu.
— Auuuuuuu… Auuuuuuu… uuu…
Por questão de precaução, apenas por isso, vou vazar também. Depois a gente continua.
Minha Senhora Sant’Anna, valei-me!
*Clauder Arcanjo é escritor e editor, membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras.
The Blue Room, de Picasso.
Robertão Social, dias depois, prendeu um garoto. O pobre rapazola estava em descarga onanista, mas Robertão atribuiu tal hábito a quem veio de Marte.
— Os marcianos procriam pelas mãos! — anunciou.
Quando João Américo, o protofilósofo de Licânia, soube do inusitado, deixou mais do que depressa o seu esconderijo platônico no sopé do Serrote e cuidou de fazer a defesa do suposto extraterrestre:
— Se for assim, caro investigador, todos os homens nesta querida província vieram de Marte. Quem não foi, ou ainda é, punheteiro que atire a primeira pedra! Digo, a primeira condenação.
O senhor prefeito, que se servira das próprias carnes quando em sua juventude, apressou-se a libertar o assustado rapazola.
— Vai-te e não faças isso mais, que acaba te gerando uma fraqueza daquelas! Sei disso porque ainda me lembro da tosse braba que arranjei.
João Américo, sempre acompanhado de seus compêndios, aprofundou o colóquio com Robertão Social. Não foi difícil descobrir a cartilha em que rezava aquele ufo-detetive.
— Com isso aí, suspeito, você será motivo de troça — advertiu-o.
A cartilha do Robertão era o livro Eram os deuses astronautas?, de Erich von Däniken. Considerado por João Américo um tomo repleto de achados superados.
O secretário de finanças de Licânia, que havia assinado um contrato astronômico com Robertão, tangeu o protofilósofo de volta para o sopé do Serrote da Rola, alegando que haveria uma reunião extraordinária do gabinete de crise, a fim de decidirem as ações emergenciais necessárias para o enfrentamento do conflito.
— Que conflito, se vocês fugiram? — intrometeu-se Gazumba.
— Cabo Jacinto! Cuide de levar o Gazumba. Recolha-o e enquadre-o na Lei de Segurança Sideral — ordenou o Lau, recém-nomeado chefe de gabinete, devido à vacância do cargo com o sumiço do ocupante anterior.
Em Licânia, caros leitores, quando um admirador da cachaça é ameaçado, instala-se um clima de guerra. E com a ordem de prisão proferida contra o Gazumba, a coisa não foi diferente.
Não se sabe de onde tanta gente saiu, mas a verdade é que, num piscar de olhos, mais de uma vintena de cachaceiros fechou o cerco, evitando a saída do Gazumba.
— Um por todos, todos por uma… Digo, por um! — bradou Zé Aguiar, à frente dos amotinados.
João Américo, afeito à retaguarda de qualquer conflito, subsidiava os insurrectos com as palavras de ordem:
— Alea jacta est!, digam agora todos.
— Alheia a jaca é!
O nível de álcool estava muito alto no juízo da legião de pinguços. Aquilo que saiu da boca deles foi algo de fazer Roma cair, quanto mais Licânia.
— Bando de ignorantes! Desrespeitaram o legado de Júlio César — disparou João Américo.
— Aí dentro!
— Quem foi que disse isso? Se for homem, apresente-se! — gritava colérico o protofilósofo, abandonando a posição de retaguarda e partindo para a frente de combate.
Nisso, um uivo arrepiante rasgou a mataria:
— Auuuuuuu… Auuuuuuu… uuu…
& & &
“E o que se deu depois, seu narrador?”
E eu lá sei! Não ficou ninguém para me relatar o que se seguiu.
— Auuuuuuu… Auuuuuuu… uuu…
Por questão de precaução, apenas por isso, vou vazar também. Depois a gente continua.
Minha Senhora Sant’Anna, valei-me!
*Clauder Arcanjo é escritor e editor, membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras.