Joyce Moura: O Cessar-Fogo na Ucrânia e o Poder de Trump

A recente aceitação da Ucrânia a um cessar-fogo imediato de 30 dias, mediado pelos Estados Unidos, escancara não apenas a exaustão de um país devastado pela guerra, mas também o jogo geopolítico no qual Volodymyr Zelensky foi obrigado a engolir o próprio orgulho para garantir a sobrevivência de sua nação. O teatro diplomático que se desenrolou entre os EUA e a Ucrânia, coroado pela reunião na Arábia Saudita, deixa claro que, mais do que um avanço para a paz, esse acordo é um sintoma de uma realidade brutal: quem manda agora é Donald Trump.

 

A submissão de Zelensky não aconteceu de imediato. Em sua visita anterior à Casa Branca, ele teve de enfrentar uma das maiores humilhações políticas de sua carreira. A cena de sua expulsão da Sala Oval, depois de um bate-boca com Trump e seu vice J.D. Vance, foi um choque não só para os ucranianos, mas para toda a diplomacia ocidental. Acostumado ao apoio incondicional dos EUA durante o governo Biden, Zelensky descobriu que o jogo mudou. Trump, como sempre, vê tudo sob a ótica do negócio: se a Ucrânia quer apoio, que pague um preço alto — e nesse caso, o preço pode ser não apenas a exploração de seus minérios pelos americanos, mas também a aceitação tácita de uma vitória parcial de Putin.

 

Trump e Putin: Um Novo Eixo de Poder?

 

Se a Rússia ainda não respondeu oficialmente ao cessar-fogo, é porque Putin não precisa se apressar. Ele já percebeu que o tabuleiro está se inclinando a seu favor. A guerra desgastou o Ocidente, drenou recursos dos EUA e da Europa e fortaleceu o bloco Rússia-China. Com Trump de volta ao comando da política externa americana, Moscou sabe que a postura de Washington será menos hostil. Trump nunca escondeu sua admiração pelo líder russo e já deu sinais claros de que não pretende continuar o jogo de apoio irrestrito à Ucrânia.

 

Nesse cenário, Putin não apenas sobreviveu às sanções e ao isolamento, mas agora se vê diante da possibilidade de sair da guerra sem grandes consequências. Se aceitar o cessar-fogo e as negociações de paz, poderá consolidar as conquistas territoriais na Ucrânia e, ao mesmo tempo, reforçar sua imagem interna de líder que desafiou e venceu o Ocidente. Se rejeitar, continuará ditando os rumos da guerra enquanto observa os EUA e a Europa se debaterem entre o desgaste militar e a pressão política.

 

Zelensky: Entre a Sobrevivência e a Rendição

 

O cessar-fogo temporário pode ser um alívio imediato para a Ucrânia, mas a que custo? Ao aceitar a proposta dos EUA, Zelensky está, na prática, assinando um cheque em branco para Trump e colocando o futuro de seu país nas mãos de um governo que já demonstrou pouca paciência para sua resistência. A insistência dos EUA em um acordo econômico para a exploração dos minérios ucranianos indica que, além da paz, há interesses financeiros profundos em jogo. A Ucrânia, que já depende amplamente da ajuda americana, corre o risco de se tornar uma nação refém dos ditames de Washington.

 

A pergunta que fica é: Putin aceitará um acordo que não lhe traga uma vitória clara? Ou apenas usará o cessar-fogo para reorganizar suas forças e voltar mais forte? Com Trump no poder, Zelensky pode ter evitado um rompimento total com os EUA, mas também pode ter entregado a chave da guerra ao seu maior inimigo. O preço da paz, neste caso, pode ser a confirmação do que Putin sempre quis: a prova de que o Ocidente não estava disposto a levar essa guerra até o fim.

 

Ao fim das contas, o que está sendo selado não é apenas um possível cessar-fogo, mas a redefinição de uma nova ordem mundial, onde a Ucrânia, depois de lutar tanto, pode acabar se vendo como uma peça descartável no tabuleiro de gigantes.

 

Por Joyce Moura – jornalista

@joycemourarealize

Deixe um comentário