Governo Bolsonaro corta R$ 1,9 bilhão do Minha Casa, Minha Vida para 2020

A luta por moradia popular sofreu dois duros golpes na última semana. O primeiro foi o cancelamento de duas portarias que previam a destinação de verbas federais para a construção de 35 mil unidades habitacionais no país todo. O segundo veio com a Proposta de Lei Orçamentária (PLOA) de 2020, encaminhada pelo governo para o Congresso Nacional. Ela prevê a redução de 41% nas verbas do Minha Casa, Minha Vida, o que equivale a um corte de R$ 1,9 bilhão.

Se aprovada a PLOA, apenas R$ 2,7 bilhões serão destinados ao programa no ano que vem. De 2009 a 2018, a média anual orçamentária do Minha Casa, Minha Vida foi de R$ 11,3 bilhões.

Com a tesourada histórica prevista para o ano que vem, a população afetada será, novamente, a de renda familiar mais baixa – até R$ 1.800 –, que pertence à faixa 1 do programa.

“Desde 2015 tem havido redução muito significativa dos investimentos na faixa 1 do Minha Casa, Minha Vida, que é voltado para a população de renda mais baixa”, diz o urbanista e professor da Faculdade de Arquitetura da USP Nabil Bonduki.

Entre 2011 a 2014, a faixa 1 representava quase metade (44,5%) das unidades habitacionais construídas pelo programa. Naquele período, foram contratadas 2,75 milhões de unidades, das quais 1,22 milhão foram destinadas às famílias da faixa 1.

Nos anos seguintes, além da redução do número total de moradias entregues, as direcionadas à faixa 1 passaram a representar somente 10%. De 2015 a 2018, 1,56 milhão de casas foram construídas pelo Minha Casa Minha Vida, e as famílias mais pobres puderam acessar a 158 mil unidades.

Segundo Bonduki, nessa faixa as pessoas não têm condições de arcar com o valor de mercado se não for com financiamento do programa. “O que vai acontecer é que nós vamos ter um crescimento do déficit habitacional, da população morando em favelas. É mais um problema sério em uma situação que já é extremamente grave”, argumenta.

Hoje o déficit habitacional atinge cerca de 7 milhões de famílias. Calculá-lo, entretanto, deve ficar cada vez mais difícil ou até impossível, uma vez que o governo decidiu remover do Censo do IBGE de 2020 as questões referentes ao valor dos aluguéis.

Portarias e Movimentos Sociais

Em setembro do ano passado o Ministério das Cidades, cedendo a pressões feitas por movimentos de luta por moradia, publicou as portarias 595 e 597/2018, selecionando projetos para o programas Minha Casa, Minha Vida Entidades (8,6 mil unidades habitacionais) e Programa Nacional de Habitação Rural (27 mil unidades).

As portarias foram, no entanto, prorrogadas de imediato por alegação de que não haveria verba suficiente para concretizar as construções. A prorrogação valia até o último dia 31, sexta-feira passada.

Usando do mesmo argumento do ano anterior e invocando o corte de verbas previsto pela PLOA para o ano que vem, o atual ministro do Desenvolvimento Regional, Gustavo Canuto, decidiu deixar que as portarias expirassem. Na prática, isso significa que não haverá novas construções do MCMV Entidades neste ano ou no ano que vem.

Os movimentos sociais que participam do Minha Casa, Minha Vida constroem por via de mutirões, em que os próprios moradores beneficiados erguem as habitações onde vão residir no futuro.

Mas mesmo as construções que já em curso estão sofrendo com os cortes do governo, como conta Evaniza Rodrigues, da Central de Movimentos Populares (CMP): “Até hoje você tem várias obras paralisadas por atraso de pagamento do governo. O que está em obra não tem dinheiro suficiente para seguir construindo. Além disso, não será construído nada novo. 2019 não contratou nada, 2020 não contratará nada”, relata Rodrigues.

Adília Sozzi, integrante do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras por Direitos (MTD), argumenta que, com a medida, o governo federal está “cortando na carne das famílias mais pobres”.

Ela relembra as ocupações Joana d’Arc, em Campinas (SP), e Flores do Campo, em Joinville (SC). Em ambos os casos “as famílias foram removidas e colocadas no aluguel social com a promessa de serem reassentadas no local uma vez que as obras ficassem prontas, mas na verdade não existe orçamento nem previsão orçamentária para a finalização dessas obras, o que deixa as famílias em situação de insegurança”.

 

Brasil de Fato