Geraldo Maia – Tibau dos velhos tempos

 

fofo geraldo 17-01Garimpando em velhos livros de histórias regionais encontramos alguns depoimentos interessantes que temos trazido para o conhecimento dos mais jovens, para que possam comparar a Tibau de hoje com a do passado.

Um dos livros que pesquisei foi “Mossoró – outras lembranças e um pouco de história”, de Francisco Obery Rodrigues. O autor, bastante conhecido na cidade, funcionário aposentado do Banco do Brasil, dedica um capítulo inteiro de suas memórias a praia de Tibau.

É um depoimento muito rico em detalhes e com um certo romantismo. Pincei alguns trechos desse depoimento, que embora esparsos são suficientes para montar uma bela foto do cenário vivido com saudosíssimo pelo autor, por volta dos anos 50:

“Ouvia muito falar na praia do Tibau. Os filhos de Escossinha, os de Pedro Leão, os de Rubens Pinto, o pessoal de João Cantídio e outras famílias iam par lá todos os fins de ano.

Minhas primeiras férias, sem outra opção, passava-as mesmo em Mossoró. Alguns anos mais tarde, combinamos ir desfrutá-las em Tibau, quase sempre no mês de setembro ou no de outubro, os mais bonitos do ano, de céu sempre exuberantemente limpo e azul pleno, dos ventos trazendo de longe as canções do mar, tempo dos cajueiros em flor, cheiro no ar, muitos cajus amadurecendo, para o nosso deleite…

A primeira casa foi a de Raimundo Fernandes, sócio de Alfredo Fernandes & Cia., que nos cedeu gentilmente. As casas para onde íamos, depois, foram variado: ora a de Raimundo, ora a de Humberto Mendes, a de Joaquim Duarte, de Álvaro Paula, de Pedro Fernandes Ribeiro, do meu irmão José Augusto ou de Tarcísio Maia.

As viagens eram feitas no caminhão misto de Isidoro, estrada de areia solta… Não havia energia elétrica, muito menos telefone, nada, a não ser um precário posto do Telégrafo, a cargo de Maria Anita.

Naquele tempo, nas primeiras vezes em que fomos, as geladeiras eram a querosene, com aquele paviozinho lá embaixo que custava a acendr. Luz, era a do candeeiro, depois as modernas Colleman, que tínhamos que bombear a toda hora. Íamos dormir cedo, por volta das 19 horas. As noites eram longas, quase sem fim, um alívio quando ouvíamos o canto do galo e, logo a seguir, saudando a madrugada, o trinado da graúna, a melodia do corrupião e do galo-de-campina, nas folhas dos coqueiros.

Quando não havia geladeira, o peixe tinha que ser moqueado, isto é, assado na brasa com farinha e conservado em urupemas.

As pessoas que conhecemos lá foram dona Rosa e o marido Zé Quinquim, caseiros de Raimundo Fernandes. Gostava de conversar com Zé Quinquim, velho pescador que não mais se aventurava pelo mar adentro. Apenas contava suas histórias que pareciam lendas.

Enconcado, com aproximadamente 1,75m, alvo, tez avermelhada, olhos da cor do oceano, ora verde, ora azuis, cabelos brancos, curtos, sob um velho chapéu de palha, sempre associava o seu tipo físico ao de Spencer Tracy, o grande ator, intérprete de Santiago, no filme “O velho e o mar”, baseado no excelente romance de Ernest Hamingway.

Logo que amanhecia, os meninos da praia gritavam no portão: olha o grude, olha a tapioca, a cocada. Toda tarde passava um velhinho oferecendo geleia de coco. Cortava, com uma faquinha amolada, as fatias douradas, deliciosas, que entregava envoltas em pedacinhos de papel de embrulho.

Depois do almoço, um peixe cozido com arroz e pirão e doce de caju como sobremesa, armava uma rede no alpendre, guardadora de sonhos, contemplando o mar e ouvindo o canto da graúna no coqueiro, até mergulhar no sono gostoso ao embalo do vento”.

São reminiscências saborosas de se ler, de imaginar aquela bucólica praia de antigamente com todos os seus encantamentos, tão diferente da Tibau de hoje. Com a estrada asfaltada, energia elétrica, telefone e água encanada, Tibau cresceu muito, bares surgiram por toda parte, carros de som em alto volume, que fazem um barulho infernal.

Dos vendedores ambulantes, alguns ainda persistem, com tapioca, grude, milho verde, geleia de coco e ovo de codorna. Mas do sossego, de dormir ao som do canto da graúna, já não mais é possível. A modernidade acabou com o romantismo.

Para saber mais sobre a história de Mossoró e região visite o blog: www.blogdogemaia.com.