Geraldo Maia do Nascimento – Sertão, velho Sertão nordestino

Antes da chegada do colonizador as terras já eram ocupadas pelas tribos indígenas Janduís e Paiacus. Mas na passagem devastadora dos povoadores dos Sertões, os primitivos habitantes foram sendo escravizados, massacrados e expulsos de suas terras e nessas, os povoadores fincaram os mourões das porteiras dos currais de gado. Já não havia mais lugar para os nativos. Assim começou o desbravamento do Sertão potiguar.

Sertão, velho Sertão nordestino. Sertão de lutas, de agruras, Sertão sofredor. Se o ano for de seca, a sede, a fome e a desgraça amedrontam o sertanejo; se for ano de chuva, a fartura, a beleza do campo e o cantar da passarada alegram aquele torrão. Terras que no dizer de Euclides da Cunha são “barbaramente estéreis, maravilhosamente exuberantes”.

O vocábulo sertão, nos primórdios do povoamento brasileiro, designava todas aquelas regiões ainda não povoadas ou ainda mal ocupadas do país. Como a natureza hostil do interior do Nordeste dificultou a fixação humana da região, gerando uma ocupação rarefeita de lento e penoso adensamento, moldando o isolamento das comunidades, foi consagrado o nome sertão para todo aquele imenso território coberto pelas caatingas.

Podemos dizer que foi o gado o desbravador do Sertão. Os imensos canaviais da costa das capitanias do Nordeste eram as bases de uma economia mercantilista que fez com que o litoral bastasse aos portugueses. Toda a terra fértil, próxima ao litoral, estava destinada, por determinação da Coroa, ao cultivo exclusivo da cana-de-açúcar. Não sobrava, dessa forma, espaço para o desenvolvimento de atividades acessórias como a pecuária, que fornecia carne e força motriz aos engenhos. Daí surgiu, no litoral, a necessidade de separação entre a monocultura da cana e a pecuária. Uma Carta-Régia de 1701 determinava que as dez primeiras léguas, a partir da batida do mar (aproximadamente 60 Km), eram destinadas à cana-de-açúcar. Para o gado, sobrava o Sertão. Foi no interior das capitanias, como a do Rio Grande do Norte, que o criatório mais se desenvolveu, mesmo com a resistência indígena contra os primeiros assentamentos de fazendas.

Oswaldo Lamartine dizia que “a semente do gado trazida do reino para cá foi inicialmente para suprir a necessidade de força do cangote do boi no giro tardo das almanjarras dos engenhos, ou no gemer lamuriento das cantadeiras dos carros de boi, carregando cana e lenha, de vez que os trapiches requeriam sessenta bois, dos quais moíam de doze em doze horas revezados. Depois, à medida que crescia a parição foi, então, havendo maior aproveitamento do leite, das carnes e dos couros”.

E foi assim que os caçadores se internaram no Sertão, rompendo pelos caminhos das águas, ou da areia, já que na estiagem os rios secavam. A marcha era lenta e penosa, castigada pelo sol abrasador, pela sede, rasgando as carnes nos espinhos da sarjadeira, da jurema, do sabiá, da macambira, da quixadeira, do juazeiro, do cardeiro ou do xique-xique, muitos perdendo a vida pelas flechas do caboclo brabo ou pela picada venenosa da jararaca ou cascavel.

Quando encontravam terras propícias, principalmente próximas a algum rio, eram fincados os currais. As cabanas eram construídas de madeira e palha, tendo o couro como elemento fundamental. Era a época do couro, como nos ensinou Capistrano de Abreu, pois as portas das cabanas eram de couro, o rude leito aplicado ao chão duro, e, mais tarde a cama, eram de couro, todas as cordas, a borracha para carregar água, o mocó ou alforje para levar a comida, como também a mala em que se guardavam as roupas, a mochila para milhar o cavalo, a peia para prendê-lo em viagem, as bainhas das facas, as bruacas, os surrões, a roupa de entrar no mato, os banguês para costumes ou para apurar sal.

Com a implantação dos currais, consolidavam-se os aglomerados. Como religiosos fervorosos que eram, logo construíam uma capela e ao seu redor surgiam as casas, sendo a do fazendeiro a mais vistosa. Nessa, instalavam-se e moravam alguns dependentes da família: os filhos, os parentes e os aderentes. O fazendeiro era uma espécie de figura de patriarca, senhor absoluto de sua vontade e, por isso, respeitado por todos, no meio daqueles sertões obscuros, por vezes violentos. Também eram padrinhos de toda meninada.

Desse modo, a fazenda era um centro de aglutinação de pessoas que se juntavam aos que viviam no mesmo regime de família, constituída de filhos e parentes, agregados, vaqueiros, homens de confiança para qualquer serviço. O apego ao clã constituía uma espécie de credo de união do grupo tão diverso. “Tocou em um, tocou em todos”, era essa a lei do Sertão.

Continua na próxima semana. Para conhecer mais sobre a História de Mossoró visite o site: www.blogdogemaia.com.