ENTREVISTA – Neto Vale

Raimundo Nonato do Vale Neto, ou simplesmente Neto Vale, é natural de Apodi, tem 59 anos, é professor do Departamento de Gestão Ambiental da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), Mestre Pelo PPEUR-UFRN e acaba de ser eleito Presidente da Associação dos Docentes da UERN (ADUERN). Ele é militante do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e foi dirigente do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UERN no ano de 1987. Nessa entrevista ele fala sobre os rumos do movimento sindical, os desafios da ADUERN no próximo período e as principais lutas dos trabalhadores e trabalhadoras em meio à pandemia e o Governo de Jair Bolsonaro. Confira.

 

O Mossoroense: Neto, como você avalia o resulta das eleições da ADUERN, no que se refere à participação e votação da sua chapa?

Neto Vale: Avaliamos como positiva, tanto a participação nas eleições quanto a votação na Chapa: Ciência e (Re) Existência Pela Base. Considerando o contexto de pandemia, de eleição virtual e de Chapa Única. Fizemos um esforço para conversar com a categoria, participamos de 25 encontros, “visitamos” (online) todos os “Campi”. Iniciamos o diálogo com a categoria, pela Faculdade de Serviço Social, no dia 14 de julho, e, concluímos com uma visita ao “Campus” de Açu, no dia 30 de julho. Ao longo do período destinado à campanha, participamos de encontros com departamentos e faculdades: no “Campus” Central, em Mossoró; nos “Campi” de   Pau do Ferros, Patu, Açu, Natal e Caicó. Consideramos que foram encontros que contribuíram para termos um quadro do estado de ânimo da categoria. Ouvimos sugestões, palavras de apoio e estímulos, críticas ao longo período sem conquistas, em especial, salarial e a precarização do trabalho docente. Relatos e preocupações com o trabalho remoto, as perdas humanas e materiais. Neste sentido, foi importante e positiva a participação da categoria. Somos muito grato.

OM:  Quais são as principais lutas e desafios da ADUERN no próximo período?

NV: As lutas são cotidianas, na vida de um sindicato e de uma categoria: observar as condições de trabalho da categoria e buscar soluções para os problemas que vão sendo identificados, num diálogo permanente e próximos com as gestões da universidade e do Estado. São demandas as mais diversas que exige a presença ou resposta do sindicato, pode ser relacionada a questões de infraestrutura que afetam o tripé ensino-pesquisa-extensão (nesses dias vi uma campanha de estudantes para a sociedade contribuir de alguma forma para resolver determinado problema numa de nossas faculdades), como o recorrente problema de falta de transportes para visitas técnicas, aulas de campo, perdas de emendas parlamentares, …), a conclusões de obras que se inicia mas sem previsão de término com desperdício de recursos público, tão necessários a nossa UERN; necessidade de novos investimentos, significa que o estado precisa olhar mais e melhor para a instituição; questões relacionadas a precarização e desvalorização do trabalho docente ( as recentes denúncias da situação dos “Substitutos”, com perdas de conquistas históricas: 13º salario, Férias, pagamento da titulação resumida a graduação, decisões da gestão que depõe negativamente contra a instituição), com acúmulo de mais de dez anos sem recomposição  salarial e observando os nossos salários, nesse período, definhando ano a ano. Toda essa situação exigirá da nossa gestão um  olhar especial e ações . Os desafios principais para o próximo período: a luta pela autonomia de gestão financeira da UERN, maior desafio pós sua estadualização; um novo concurso público; a atualização do nosso Plano de Cargos, Carreira e Salários, e, contribuir para a construção de um ambiente interno democrático que permita o debate franco, aberto e respeitoso sobre tudo que afeta as nossas relações e que contribuam para o fortalecimento da instituição. Estamos falando de homens e mulheres que construíram e constroem a nossa universidade, cotidianamente. Neste sentido, todos os esforços, ações, devem ser para proporcionar as melhores condições de trabalho e sua valorização, seja para quem a constrói no presente, seja para quem iniciou essa grande obra.

OM: Como você avalia as recentes gestões da Reitoria da UERN – Professor Pedro Fernandes e Professora Fátima Rachel?

NV: Desde sua estadualização que a UERN avança e se fortalece, numa ação de toda sua comunidade, mas não necessariamente articulada, integrada, harmoniosa entre os diversos atores que a compõe, dada o caráter centralizador e antidemocrático de algumas gestões. A gestão do Professor Pedro e da professora Raquel, aproxima-se do fim, 08 anos de gestão, tem coisas positivas: crescimento da pós-graduação, ampliação da política de capacitação, bolsas em geral), política de inclusão. As negativas: o grupo de onde Pedro foi alçado à reitoria, está há décadas a frente da instituição, nesse período todo foram próximo aos ocupantes do palácio Potengi, o professor Pedro chegou até a se filiar ao partido de um desses ocupantes, porém a questão da autonomia de gestão financeira, nunca foi prioridade desse grupo. O debate e as perspectivas que se colocam hoje são por imposição do perfil da ocupante do Palácio Potengi, a Professora Fatima Bezerra, não por ação da gestão, mas precisamos lutar, nada acontece sem luta. Outra característica negativa é a centralização e postura antidemocrática, atacou sistematicamente a autonomia do nosso sindicato, até escolha de nossos representantes para os espaços deliberativos da instituição, concentrou e sem nenhuma transparência, na reitoria. O Sindicato desenvolve uma luta pela atualização do nosso PCCS, que é de 1989,  no período de sua gestão não conheço nenhuma ação para atualizá-lo. Aliás, recentemente, era preciso fazer uma atualização dos dados, a gestão conseguiu – pasmem – atrasar repasse. O nosso Auxílio Saúde, por ação da reitoria, recentemente, deixou de ser  reajustado, perdemos de fazer isso em 2020(?) e 2021, agora. só em 2022. As discussões sobre os Estatutos foram e continua com o Regimento, sem ou com pouquíssimo diálogo, só se consegue alterar alguma metodologia (longe de mudar os conteúdos de suas concepções, proposições), com muita pressão, denúncias. As últimas polêmicas, é sério o que vou falar, estão relacionadas a discussão do Regimento porque o texto que está em discussão se refere ao “[…]. O Reitor, […]. o Vice Reitor “, o tempo todo, quando já temos uma Reitora eleita. Foi necessário a ADUERN denunciar essa e outras questões para ser ouvida, apontava erros óbvios, além de manter o caráter centralizador. Tem sido esse o caráter dessa gestão, só se muda e melhora alguma norma ou alguma orientação, após um conjunto de denúncias junto à comunidade interna ou externamente (como foi o caso das listas tríplices). A última polêmica é a dos professores substitutos que estão submetidos a uma situação de precarização extrema, sem direito a 13º, Férias…, não receberão por sua titulação (independente que seja especialista, mestre ou doutor), receberão como graduado. Péssimo para a imagem da UERN e de seus gestores. Cabe ressaltar que o professor Pedro quase que desapareceu no segundo mandato, inclusive solicitando seu afastamento, por um ano, em plena pandemia, cometendo outro erro e comprometendo o discurso de que valorizava a mulher, até hoje a professora Raquel “é reitora em exercício”, quando podia ter sido efetivada e ter sido a terceira mulher, como reitora efetiva da UERN. O professor Pedro sai pelas portas do fundo. Quer dizer, Pedro/Raquel deixam suas contribuições, mas deixa um passivo muito ruim e que precisamos falar e enfrentá-lo, um a um, na perspectiva de superá-lo, isso é muito importante para que possamos nos dedicar a vencer os desafios, já colocados, é urgente.

OM: Qual é a sua expectativa para a gestão da Professora Cicília Rachel? Vocês irão assumir os cargos praticamente na mesma data – você presidente da ADUERN e ela Reitora da Universidade?

NV: É uma necessidade para a UERN, para a nossa categoria e a comunidade uerniana, criarmos as melhores expectativas. Como diria o poeta, “o tempo não para “e a realidade está sempre mudando, as pessoas também. Torço para que a professora Cicília e o professor Francisco, ouvindo e recepcionando às demandas dos segmentos da UERN, escrevam uma nova e alvissareira página na história da Instituição. Os desafios são enormes, mas se prevalecer o respeito a autonomia de cada segmentos, o dialogo como base desse novo momento e a vontade de construir consensos, a grande vencedora será a UERN. Desejo boa sorte a nova gestão.

OM: Os professores e professoras da UERN estão há muitos anos sem reajuste salarial. Como você avalia o impacto disso na vida e dinâmica profissional da categoria?

NV: Muitas das críticas que ouvimos no diálogo com a categoria, tem como pano de fundo, uma década sem valorização salarial. Essa situação dificulta um diálogo melhor e construção de uma agenda que aponte perspectivas de rompermos com essa situação. Há também algumas incompreensões quanto ao ônus dessa falta de reajustes, não pode ser depositado só sobre os ombros do sindicato. É uma responsabilidade, em especial, quanto a mobilizações de esforços, partilhada, mesmo que ocorra com cada parte (Sindicato e reitoria) em seu quadrado. Pesa no cotidiano dos nossos colegas, todos e todas têm um conjunto de obrigações, as mais diversas possíveis: são pais de famílias; alguns, mesmo solteiro ou solteira, são a única fortaleza que seus entes contam; temos que suprir a falta de investimentos na instituições e assumimos esse vácuo, aconteceu muito agora na pandemia; o quadro de crise que assola o país, piora e coloca mais dificuldades às vidas das pessoas, somos afetados também; nesses últimos dez anos, tudo subiu de preço e os nossos vencimentos não acompanhou esse processo inflacionário, ao contrário, perdeu parte de seu poder aquisitivo. Claro que afeta o nosso cotidiano, mudar essa situação é uma tarefa de toda a categoria. Esperamos, coletivamente, contribuir para melhorar esse quadro. O papel do sindicato é abrir e construir diálogos e consensos com a categoria, apresentando alternativas de mobilizações; articular-se, se necessário, com outros movimentos; escolher as melhores estratégias que permita novas conquistas. É o nosso propósito.

OM: A UERN em breve deverá retomar o retorno presencial das atividades, como você está avaliando esse quadro? Quais são os riscos e demandas da universidade nesse momento?

NV: Caminhamos para o retorno das atividades presenciais. Somos uma instituição especial, pois é nela que se constrói a ciência, o conhecimento, as melhores estratégias para enfrentar a pandemia. Veja a contribuição da FIOCRUZ, Butantã, a universidade publica brasileira, o nosso maior patrimônio, o SUS. A universidade sabe das perdas irreparáveis que a pandemia causou e vem causando as famílias brasileiras. A UERN perdeu pessoas brilhantes, cheias de sonhos. O trabalho remoto contribuiu para revelar mais ainda, um quadro caótico dela conhecido, o impacto das desigualdades na vida de nossos estudantes. Espero que a universidade não se deixe pautar pelo discurso mercadológico que está influenciando fortemente o retorno às atividades presenciais, a melhor hora a ciência já indicou, será com toda a comunidade uerniana vacinada, avanço da vacinação no país. Outros países, em situação melhor de vacinação de sua população que a nossa, enfrenta revés, nesse momento, com o surgimento de novas variantes: EUA, Japão, … a China. Quero muito voltar às atividades presenciais. Mas temos que ter muita calma, vidas importam.

OM: Como você espera que seja a relação da ADUERN com o Governo de Fátima Bezerra? Podemos presumir que esse é um governo com maior identidade com o Movimento Sindical. Você acredita que a Governadora tem maior sensibilidade às pautas dos docentes do que outros Governo?

NV: Sem dúvidas, existe essa identidade com o movimento sindical, é sua origem. Na prática, tem essa sensibilidade às pautas das categorias, basta observar o tratamento à segurança, setores da educação e outras categorias. No entanto, com a nossa categoria, a professora Fatima, concretamente não aconteceu. Entretanto, dois dos maiores desafios que temos pela frente, já foram recepcionados pela governadora, o que a diferencia dos gestores anteriores e estão sendo discutidos por duas comissões formada por representantes do Governo Fátima e da UERN (ADUERN, SINTAUERN e Reitoria). A Comissão da Autonomia está funcionando, a Comissão do Plano de Cargos, Carreira e Salários, foi formada, mas ainda não está funcionando. Essas pautas podem colocar a governadora Fatima, nessa nova página da história da UERN. As minhas expectativas são as melhores possíveis, tanto com a governadora Fatima quanto com a nova Reitora Cicília. Quanto a nossa relação, seja com a governadora Fátima que ajudei com o meu voto, seja com a nova reitora Cicília que não votei, será a mesma: baseada no respeito, no diálogo, na construção dos consensos de forma autônoma e independente perante suas gestões, cujos resultados esperamos que sejam os melhores para a universidade e para a nossa categoria. Fui eleito por nossa categoria para defender seus interesses e temos claro quais são, daremos o melhor de cada diretor e diretora para garantir que esses interesses sejam transformados em conquistas. Estamos com pressa, nenhum direito a menos.

OM: A ADUERN tem sido bem presente na luta contra o Governo de Jair Bolsonaro. Como você avalia a gestão do Presidente diante da Pandemia?

NV: Somos parte do movimento sindical desse país, penalizado, todos os dias por uma ação desse governo. Ataca a autonomia das universidades e reduz os investimentos; todas as reformas foram prejudiciais aos trabalhadores: a da previdência, dificultou, comprometeu o direito à aposentadoria futura; a reforma administrativa, em curso, destrói o serviço público; as privatizações, agora a dos Correios é prejudicial aos interesses de um estado soberano e causará demissões e precarizará as relações de trabalho. Enfim, suas ações destrói a economia nacional e as expectativas do povo brasileiro de um futuro melhor. Diante da pandemia a sua gestão é criticada por autoridades sanitárias, do país e externamente. Sua omissão é responsável por parte das quase 600 mil mortes, até agora. Portanto, a sua gestão e caótica, não dialoga com os interesses dos milhões de desempregados e sua política econômica trouxe de volta a inflação, piorando a vida das famílias brasileiras, sem falar que suas posturas a favor do armamento, o seu discurso de ódio influencia e alimenta seus seguidores, cujo triste resultado é a morte de inocentes. Por último, a revelação do envolvimento do presidente e de suas famílias em esquemas de corrupção, identificadas até agora pela CPI da COVID-19. Portanto, é urgente o seu impeachment.

OM: Como será a postura de sua gestão diante desse Governo? Quais serão as estratégias de luta?

NV: Diante de governo, gestão, partidos políticos, será de independência e de autonomia. A nossa prioridade é a defesa dos interesses da nossa categoria, não descuidaremos dessa questão, será o nosso foco central. Mas como parte do movimento sindical, social e popular, objeto de uma política que ameaça a existência da paz e de condições melhores para o povo é dever nosso e da sociedade participar das mobilização para por fim a esse desgoverno.

Deixe um comentário