ENTREVISTA – Gabriel Barcellos: “Se a alternativa de Mossoró é via Ceará, vamos trabalhar via Ceará”

Entrevista – Gabriel Barcellos

A entrevista da semana mostra as impressões do diretor do Hotel Thermas de Mossoró com relação ao segmento hoteleiro e de turismo na região. Gabriel Barcellos fala do impacto da crise no segmento, dos problemas estruturais com a malha viária e aeroporto, além das saídas para impedir a falência do setor. Um dos articuladores do projeto Rota das Falésias, o empresário detalhe a iniciativa que unirá Ceará e Rio Grande do Norte na abertura de um novo destino para turistas brasileiros e internacionais, tida como a redenção para o setor do turismo em importantes cidades dos dois estados.

MÁRCIO COSTA – Vivemos uma das piores crises econômicas da história do País. De que forma a crise tem afetado o segmento do turismo na região de Mossoró?

GABRIEL BARCELLOS – Está atingindo diretamente. Estamos sofrendo consequências de uma crise nacional, mas especificamente em Mossoró nós temos um agravante. Muito do movimento do turismo de negócio era atrelado a Petrobras, cujo fluxo já vinha caindo, mas nos últimos seis meses despencou, e as últimas noticias não são nada animadoras. Como tínhamos um fluxo de negócios, e todos os hotéis dependem deste tipo de negócios, então nós temos o problema da crise nacional agravado com a perda do fluxo da Petrobras que é uma grande movimentadora. Por que não é apenas a Petrobras mas todo o sistema que gira em torno dela. Isso afetou grandemente a ocupação dos hotéis que estão sofrendo com a queda de ocupação.

MC – A crise econômica tem fechado muitos empreendimentos em vários segmentos. É possível que a crise venha a fechar algum empreendimento do setor hoteleiro em Mossoró?

GB – Existe este risco sim. Estamos acompanhando e estão ocorrendo muitas demissões no setor. Se as coisas não melhorarem, se não revertermos de alguma forma, não cabe todo mundo do tamanho do mercado que se encontra hoje. Existe um excesso de oferta. Teremos que buscar alternativas sob pena de alguns empreendimentos se tornarem inviáveis. É lamentável, por que conseguimos obter um segmento com bom tamanho, com um bom número de empregos diretos e indiretos que dependem dos hotéis, e esta realidade pode desencadear um fluxo negativo pra todo mundo.

MC – O turismo de lazer pode surgir como alternativa para suprir esta lacuna?

GB – O turismo de lazer, que praticamente quem se beneficia é o Hotel Thermas, também está sofrendo. As pessoas dizem que vai aumentar o fluxo do turismo nacional, mas os números não refletem isso. O turismo de Mossoró é basicamente regional por que não temos acessos, somos isolados. É um turismo de fim de semana. São turistas que vem de Fortaleza, de Natal, e vem pra cá no fim de semana. Este turismo, após o carnaval, ainda não alcançou os números obtidos no ano passado.

MC – Qual o nível da dependência dos hotéis do fluxo de turistas de negócios?

GB – O turismo de negócios para a grande maioria dos hotéis da cidade representava 90% da ocupação. Basicamente os hotéis da cidade são voltados para o segmento de negócios. Tínhamos o fluxo de alguns eventos como o Mossoró Cidade Junina, Expofruit, Ficro, eventos consolidados que também estão passando por dificuldades, e grande parte deste fluxo, não sei quantificar, mas cerca de 50%, são oriundos do segmento do petróleo, que realmente está sofrendo uma crise muito grande. Então você imagina que as ocupações dos hotéis despencaram.

MC – O segmento do petróleo, que foi muito forte em Mossoró, parece ter entrado num declínio irreversível. O que fazer para suprir esta lacuna?

GB – Temos conversado com as pessoas que é preciso buscar alternativas. Não adianta ficar pensando no passado, por que como você colocou, se não é um processo irreversível, é de difícil recuperação, e se recuperar, dificilmente chegará aos patamares que um dia chegou. É preciso buscar alternativas para o setor do turismo. É preciso buscar eventos que gerem fluxo. A captação de eventos que gerem fluxo de pessoas de fora que possa vir gastar dinheiro na cidade. Mossoró tem toda a infraestrutura para isso. Fortalecer eventos já existentes como o Mossoró Cidade Junina, mas fortalecer de forma que se tenha um retorno financeiro do que é investido. Um evento como o Mossoró Cidade Junina só se justifica quando traz pessoas de fora que injetem seu dinheiro na economia local. Se for fazer um evento exclusivamente para a cidade não se justifica diante do atual momento. O evento precisa ser pensado para atrair o turista. Existe um potencial de lazer em Mossoró e região. Temos uma variedade de atrações aqui que interessariam as pessoas do Brasil e até de fora do Brasil. Começamos a pensar pela água termal que é um forte atrativo turístico em qualquer lugar, impulsionador econômico para um turismo muito forte. Temos a questão das salinas que as pessoas daqui não dão valor, mas as pessoas que vem de fora se encantam com as salinas. Temos a fruticultura. Recebemos um grupo de empresários japoneses em março e um dos passeios foi visitar uma fazenda de melão. Aqui temos pinturas rupestres, praias com águas quentes espetaculares, as Dunas do Rosado, a questão cultural da cidade. É muita coisa que pode ser explorada, mas que é pouco explorado. O potencial existe, mas como fazer para atrair as pessoas para este potencial todo?

MC – Existe um caminho que possa racionalizar e acelerar esta exploração?

GB – Uma das estratégias que temos buscado é a integração de Mossoró a Rota das Falésias que está sendo trabalhada no Ceará. Ela vem até Icapuí, pertinho daqui. Se imaginarmos que Canoa Quebrada recebe um bom fluxo nacional e até internacional, este público vem até Icapuí e volta, por que não vem até aqui? Não vem por que não sabem do nosso potencial, por que não é oferecido, trabalhado. Estamos mostrando a importância de Mossoró fazer parte deste roteiro abrangendo dois estados. Isso comercialmente é muito interessante por que o turista conheceria dois estados. A entrada de Mossoró fortaleceria o turismo da região e da rota. A entrada seria via Fortaleza, ou Aracati, que tem um aeroporto pronto e estruturado a 80 quilômetros daqui. A entrada de Mossoró ajudaria inclusive a consolidar este aeroporto como de turismo. Teria como vir de qualquer parte do mundo via este aeroporto e conhecer as belezas da região independente de Fortaleza e Natal. Esta região está pronta. As pessoas precisam conhecer.

MC – Como está o processo de amadurecimento desta proposta?

GB – Nos tivemos duas reuniões com o grupo gestor da Rota das Falésias. Em Fortaleza (CE) propomos a integração de Mossoró neste projeto. Esta rota vai de Aquiraz até Icapuí. Apresentamos a proposta de estender de Icapuí até Mossoró, prolongando mais cerca de 50 quilômetros, numa relação que traria vantagens para a Rota das Falésias, já que Mossoró agregaria uma série de atrativos turísticos e de estrutura pronta, e de mesma forma que este litoral cearense está completamente desenvolvido agregaria muito à nossa região. Poderíamos trabalhar um destino turístico para atrair turistas nacionais e internacionais. Foi apresentada esta proposta numa primeira reunião com o grupo gestor em Fortaleza, houve o interesse de prolongar o assunto. Eles vieram até Mossoró, onde conheceram a infraestrutura que está à disposição, e estou bastante otimista de que possamos criar esta região turística envolvendo o litoral leste do Ceará e Mossoró. Acho que temos muito a ganhar no desenvolvimento desta região. Estou bastante otimista com o resultado das ações que já podem garantir voos da Azul para o aeroporto de Aracati. Acho que estamos caminhando bem e temos um futuro promissor neste trabalho em conjunto.

MC – O primeiro passo para integração de Mossoró ao projeto Rota das Falésias partiu de representantes do Ceará. Falta iniciativa das autoridades do Rio Grande do Norte para projetos desta ordem?

GB – Isso é algo que já vem rolando há um ano e meio. Tivemos algumas reuniões com representantes do Ceará e passamos a ter o apoio do Sebrae do Rio Grande do Norte. O setor público está começando a se envolver agora de alguma forma. Existe todo um foco para o Polo Costa Branca, que tem sua importância institucional de debater o turismo, mas não vejo como uma realidade comercial próxima. O que acontece é que vivemos uma realidade que precisa de turista para o mês que vem. E ai? Já foram feitos muitos levantamentos, mas comercialmente precisamos de algo concreto. Precisamos vender o que já temos. Precisamos partir para questões práticas, concretas, comerciais. O Polo Costa Branca está ficando desacreditado. São 10 anos de reuniões e ninguém tem ido mais. Se a alternativa de Mossoró é via Ceará, vamos trabalhar via Ceará. Todos de mãos dadas para consolidar a região onde todos vão se beneficiar.

MC – O secretário estadual de turismo é um empresário do setor e conhece a realidade do segmento. Ele tem realizado um bom trabalho?

GB – Ele tem feito uma boa gestão, não há como negar isso. Ocorreram vários avanços para o turismo do Rio Grande do Norte. Acontece que este benefício não chega a nossa região. Com relação à região de Mossoró não houve beneficio nenhum. Podem chegar 200 voos fretados a Natal, nós não vamos tirar proveito disso. Por que? Porque estamos a 270 quilômetros de distância, com uma estrada ruim. Não temos um aeroporto. Não temos como receber este turista aqui. É importante para o Estado. A região de Natal concentra a maior quantidade de hotéis. Para a região de Natal não há dúvida de que a gestão está sendo bem feita. Em relação a Mossoró e região não mudou nada. Não vai mudar nada.

MC – A falta de um aeroporto em Mossoró compromete o setor?

GB – Sem dúvida. Sem um aeroporto ficamos atrelados a estradas que de Natal para Mossoró é ruim. De Fortaleza para Mossoró já tem parte duplicada. Cada vez estamos mais próximos de Fortaleza. De lá para Mossoró são mais de 600 empreendimentos na área de turismo. De Mossoró para Natal tem o que? Não tem nada. Um aeroporto é de suma importância. Vamos a São Paulo, falamos da região, e perguntam: “Como é que eu chego?”. Respondemos que é preciso ir para Natal. Ai vem como? Ônibus? Péssima a linha de ônibus. Chega a durar seis horas uma viagem de Natal para Mossoró. São poucas as opções. A maioria de ônibus sucateados. Avião, não tem. Precisa ter muita vontade para conhecer Mossoró. Não tem como trabalhar turisticamente desta forma. O aeroporto está fechado e não temos a infraestrutura. A alternativa que temos hoje é trabalhar via Ceará.

MC – O Governo do Estado tem prometido reformar o aeroporto de Mossoró e viabilizar voos comerciais. Você acredita que seja possível resolver estas questões a médio prazo?

GB – Acho que a necessidade de reformar o aeroporto é eminente. Precisa. Uma cidade como Mossoró precisa até por questão de saúde pública. Onde desce um avião no caso de necessidade de uma UTI aérea? Vai ter que descer em Aracati. Uma cidade do tamanho de Mossoró precisa de um aeroporto. Sempre discordei de construir um novo aeroporto. Revitalizar e fazer as adaptações já atenderia nossas necessidades. A questão de voos comerciais, já tivemos voos da BRA e da NoAr que eram viáveis economicamente. Os voos não pararam por falta de viabilidade da cidade. A BRA fechou. A NoAr foi vitima de um acidente aéreo e também fechou. Não foi por falta de fluxo de pessoas. As pessoas as vezes confundem dizendo que os voos são apenas para Natal ou Fortaleza. A questão é ligar Mossoró à malha aérea. Vemos que a questão de voos comerciais neste momento não é tão fácil. Tivemos uma desaceleração do fluxo de negócios. As próprias companhias aéreas diminuindo o tamanho das suas aeronaves, modificando suas rotas, mas é algo que tem que se buscar. Hoje a alternativa que temos para o turismo de lazer é o aeroporto de Aracati, que nos atende perfeitamente. Agora Mossoró precisa ter um aeroporto.

MC – É caro fazer turismo em Mossoró?

GB – Não, não é não. Se comparar com outros destinos Mossoró é bem barato. Mesmo se você for a Canoa Quebrada você verá que os preços são outros. Vai numa barraca de praia lá, os preços são diferentes de barracas que temos na região. Por exemplo, o Hotel Thermas se fosse localizado em outra região do País suas tarifas seriam outras. Não é caro de forma nenhuma. Temos boas atrações, bons preços, os atrativos são muitos. Precisamos embalar o produto e mostrar que existe isso para as pessoas. As pessoas não sabem que existe isso.

MC – Temos atrativos, bons equipamentos, o que falta para que o segmento se fortaleça?

GB – Acho que faltou esta ideia de integrar ao Ceará. Estamos isolados em termos de Rio Grande do Norte. Não existem acessos. Fica inviável trazer alguém de Natal quebrando pacote fechado com uma operadora de sete noites. Vender sem ter acesso. Ficamos isolados sempre. Acredito que se integrarmos ao Ceará não ficaremos mais isolados. Teremos uma entrada com estrada boa que vem de Fortaleza. Um aeroporto em Aracati. Um turista que chega a 50 quilômetros daqui, que vem até Icapuí e volta. Que não vem até aqui por que não é divulgado. Acho que esta é uma excelente alternativa se não for a única para o desenvolvimento do turismo desta região. Estamos a 35 quilômetros da divisa com o Ceará. Acredito fortemente que este é o caminho. Nós seremos beneficiados, e esta região do Ceará também. Vamos receber e vamos emitir turistas que começarão a descobrir o potencial turístico da região e vão querer conhecer de uma forma melhor. Quantos turistas da região de Mossoró já fizeram um passeio de buggy nas falésias de Beberibe?  Poucos, por que foi pouco divulgado.

MC – Você cita a realização de eventos como potencializador do segmento como alternativa para preencher a lacuna deixada por outros segmentos da economia local.  Quais outros eventos poderiam somar ao Mossoró Cidade Junina para gerar fluxo turístico na cidade?

GB – Lembro que em anos anteriores era realizado o Festival Aéreo de Mossoró. É um evento de interesse turístico que reúne dezenas de proprietários de aviões particulares. Um público que vem e gera um movimento bom. Ele vai pra restaurante, ocupa hotel, deixa recurso. Com pouco investimento você consegue atrair um evento como este. Teve outro evento também chamado Cerapío, um rallye, que atraiu centenas de pessoas para a cidade. Faltou até lugar para hospedar este povo todo. Eles gastavam até mesmo em setor como o de peças de reposição para utilizar nos veículos. São eventos como estes que com um trabalho de captação podem ser atraídos com pouco investimento. É muito mais barato do que contratar uma banda de forró e você tem um retorno muito maior. O custo benefício é imenso. A questão cultural de Mossoró pode ser melhor explorada. O espetáculo “Chuva de Bala”, por exemplo, não tem uma infraestrutura voltada para o turista. São pessoas que pagariam para ter um espaço para assistir o espetáculo e não tem. É preciso pensar o São João de forma que acomode o turista. Eles vem com o dinheiro pra gastar e as vezes não gasta por que não tem onde gastar. É preciso pensar nesta realidade.

MC – No ano passado o Hotel Thermas recebeu alguns shows, incluindo um internacional com a presença da lenda do soul Billy Paul. Existe algo previsto para este ano?

GB – Existe. Estamos sendo procurados por alguns produtores. Tivemos em março, Peninha e Luís Ayrão, e temos a expectativa de receber outros shows no decorrer do ano. Alguns produtores de outros estados nos procuraram com boas ideias. Vamos iniciar cedo a preparação do nosso reveillon que em 2016 já foi muito bom, talvez o melhor de todos, e vamos trabalhar para implementar novas ideias e tornar este evento ainda maior e melhor.