Coluna de Maria Carmem: Neuroconversa sobre Disortografia
Mais um capítulo sobre os transtornos de aprendizagem e, dessa vez, vamos falar sobre a Disortografia!
Olá, Aprendentes de meu coração
Sabemos que a aprendizagem é uma combinação de capacidades como atenção, memória, processamento visual, auditivo que se desenvolvem em áreas diferentes no nosso cérebro. E que muitos são os fatores que interferem e/ou contribuem para que o desenvolvimento cognitivo aconteça de forma satisfatória e garanta o avanço dos aprendentes.
De fato, o desempenho escolar depende e se correlaciona com diversas questões, como aspectos emocionais, físicos e de relações. Assim, podemos dizer que as dificuldades escolares são observadas através dos comprometimentos ambientais, como metodologias de ensino, dinâmica familiar ou ambientes pouco estimuladores e independem das questões neurobiológicas do aprendente, mas sim dos fatores externos.
Nesse contexto, o DSM-5, fala sobre os transtornos específicos da aprendizagem, as dificuldades de aprendizagem ou de outras habilidades que podem ser desenvolvidas no contexto escolar. Esses transtornos são caracterizados pela interferência direta dos aspectos intrínsecos aos indivíduos, ou seja, depende das alterações neurobiológicas, que podem estar relacionadas a hereditariedade ou disfunções neuronais.
A Disortografia é um desses transtornos específicos de aprendizagem e representa-se pelo prejuízo na escrita, sendo caracterizado por comprometimentos relacionados a ortografia, gramática e redação, muito embora o aprendente possua capacidade intelectual.
É importante sabermos que um aprendente disléxico geralmente é disortográfico, devido suas dificuldades em reconhecer as palavras, porém, um aprendente disortográfico nem sempre é disléxico, pois essa última condição associa-se as disfunções genéticas e aos fatores biológicos. Como bem nos diz, Padiar (2016) “a disortografia geralmente é confundida com dislexia, porém são distintas, uma vez que a criança com dislexia geralmente é disortográfica, enquanto a disortográfica nem sempre é disléxica”.
Vamos saber um pouco mais sobre o que é disortografia, suas causas e tratamento?
Etimologicamente a Disortografia deriva dos conceitos “dis” (desvio) + orto (correto) + “grafia” (escrita). Esse transtorno pode ainda ser conhecido como Perturbação da Expressão Escrita, segundo o DSM-V, ou seja, é uma perturbação específica de aprendizagem, de origem neurobiológica que afeta as capacidades da expressão escrita, em particular a precisão ortográfica, a organização, estruturação e composição de textos escritos, a construção frásica é pobre e por norma curta e observa-se ainda a presença de muitos erros ortográficos.
Assim, podemos evidenciar que a disortografia é um transtorno de aprendizagem específico, caracterizado pelas dificuldades que se enfatizam na aquisição das competências da escrita e um desempenho abaixo do esperado para a sua idade e nível de escolaridade.
Segundo Ponçadilha (2016) a disortografia pode se caracterizar pela dificuldade que o indivíduo tem em fixar as formas ortográficas das palavras, tendo como característica típica a troca de grafemas e a dificuldade em assimilar as regras e os padrões da ortografia, como consequência temos a dificuldade na produção de texto. Isso porque, no momento que o aprendente passa do nível silábico-alfabético para o nível alfabético, é normal que a escrita em desordem desapareça e a disortografia torna-se um empecilho nesse processo de aquisição da escrita de tal forma que o aprendente não consegue transpor essa barreira.
Esse transtorno é um déficit causado pela dificuldade em organizar ideias e a produção textual, fazendo com que o aluno disortográfico apresente problemas estruturais capazes de prejudicar a sua aprendizagem como: dificuldade de fixação das regras ortográficas, apresentando frequentemente substituição, omissão, inversão de grafemas, alteração na segmentação de palavras, persistência do apoio da oralidade na escrita e dificuldade na produção de textos.
Os erros que mais caracterizam esse transtorno podem ser classificados, de acordo com Hudson (2019) da seguinte forma:
De caráter linguístico-perceptivo: omissões, adições e inversões de letras, de sílabas ou de palavras ou troca de símbolos linguísticos que se parecem sonoramente (“faca”/“vaca”).
De caráter visoespacial: substitui letras que se diferenciam pela sua posição no espaço (“b”/“d”); confunde-se com fonemas que apresentam dupla grafia (“ch”/“x”); omissão da letra “h”, por não ter correspondência fonêmica.
De caráter visoanalítico: não faz sínteses e/ou associações entre fonemas e grafemas, trocando letras sem qualquer sentido.
Relativos ao conteúdo: não separa sequências gráficas pertencentes a uma dada sucessão fônica, ou seja, une palavras (“ocarro” em vez de “o carro”), junta sílabas pertencentes a duas palavras (“nodiaseguinte”) ou separa palavras incorretamente.
Erros referentes às regras de ortografia: não coloca “m” antes de “b” ou “p”; ignora as regras de pontuação; esquece de iniciar as frases com letra maiúscula; desconhece a forma correta de separação das palavras, a mudança de linha, a sua divisão silábica, a utilização do hífen.
Nesse ínterim podemos perceber que o aprendente disortográfico irá encontrar maiores dificuldades na escrita do que na leitura, uma vez que esta já proporciona o modelo gráfico pronto, necessitando apenas de uma decodificação, enquanto a escrita exige que o modelo gráfico seja construído internamente no processador ortográfico, de forma que possa ser resgatado pela memória e reproduzido.
Diante de todo esse contexto nos perguntamos, como intervir e ajudar o aprendente disortográfico?
Primeiro é importante compreender que a intervenção na disortografia não deve se basear em apenas modelo ou em um modelo pronto e acabado, mas sim em várias ações interventivas que englobem a percepção auditiva, visual e espaço-temporal, a memória visual e auditiva.
Para tanto, é necessário realizar exercícios de reconhecimento das formas gráficas; identificação de erros; noção de espaço como a distinção de direita/esquerda, cima/baixo; conscientização do fonema isolado em sílaba e na soletração; análise de frases; substituição de um fonema por outro na sílaba e palavra. E, se todas as estratégias vierem com atividades dinâmicas, lúdicas e interativas, certamente o resultado será fabuloso, pois como gosto de dizer: “aprender, não precisa doer”!
Não devemos desconsiderar a necessidade das ações de intervenções realizadas por uma equipe de multiprofissionais, onde se associa o trabalho do fonoaudiólogo, do neuropsicopedagogo, dos professores. Sempre analisando e intervindo em duas vertentes: as ocorrências associadas a disortografia e os erros ortográficos propriamente ditos.
Em suma, é de extrema importância a participação da escola com seus professores, especialistas e da família, sempre em parceria, no sentido de contribuírem para que os alunos disortográficos sejam capazes de superar as dificuldades, tanto pelo atraso em relação aos demais aprendentes, quanto pela sua forma de aprender a lidar com a dificuldade que enfrenta.
E para não concluirmos, abraços pedagógicos e até a próxima!
Por Maria Carmem
Dra da Aprendizagem
@carmem.neuro.psicopedagoga
(84) 996095957