Clauder Arcanjo – COLÓQUIO COM MICA

Abro as correspondências e encontro-me com uma nótula de Miriam Carrilho, potiguar radicada na Veneza Brasileira:

Clauder, amigo querido,

como bem dizia Millôr Fernandes: “Livre pensar é só pensar”. Isso, uma ideia puxa a outra.

Bom fim de semana, cheio de inspirações.

Meu abraço,

Miriam Carrilho.

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De pronto, agradeço a leitura carinhosa de um texto meu. Assim me expressei:

Grato pela leitura, amiga Mica.

Um ótimo final de semana.

Estou com saudade de seus textos, amiga. Envie-me alguns.

Abraços de

Clauder Arcanjo.

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Pouco tempo depois, provocada por mim, ela, mergulhada num fastio literário, que lhe é pouco comum, responde-me:

Ai, Clauder, “ando muito completo de vazios”, segundo Manoel de Barros. Desde que a única filha, que ainda me dava a sensação de completude, saiu de casa para ganhar a vida — o que agradeço ao criador – estou meio parada. Ainda segundo o escritor goiano, “Tem mais presença em mim o que me falta”. Já até combinei com a minha amiga Márcia Accioly uma exposição para o fim do ano, mas, até agora, não movi um pincel, não escolhi o tema (vagamente aparecem casas simples no meio do mato, gosto delas), porém, apesar de já ter adquirido uma tela, está no chão da sala, branquinha de espera… Vou fazendo nadas, construindo castelos de areia, zapeando besteiras. Tentando me curar dessa falta de vontade. Entretenho-me com os clientes que querem desconto, com os que querem conversar, com os que vêm trocar mercadorias que escolheram durante mais de uma hora, experimentaram, pediram opinião… Sim, vejo filmes, inúmeros. Ganhei um aparelhinho que me dá a condição de escolher um monte deles. Tento concluir a leitura de Cinzas do Norte. A situação do país também é “broxante”… Dá ânsias de vômito tanto menosprezo com o povo sofrido, trabalhador, produtor, pagador dos impostos escorchantes, (des)merecedor dos serviços públicos fundamentais.

Enfim, menino, é isso.

Meu abraço, e muita saúde e entusiasmo para tudo o que precisar.

Miriam Carrilho.

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Sento-me à escrivaninha, e tento insuflar-lhe energia, devolvendo com uma notinha, que nem é cômica nem lírica:

Não desanime, amiga Mica! Há dias em que sonhamos com o vazio, e nos amasiamos com o nada. O negócio é nos amancebarmos com a Poesia e com a teimosia; duas amantes brejeiras, apesar de pouco acolhedoras.

Um beijão, e se faltar tema: pinte uma tela, lembrando-se de mim (risos…).

 

Clauder Arcanjo

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