Atividades manuais ajudam a recuperar foco e saúde mental na era das telas
Em tem pos de excesso digital, trabalhos manuais ajudam a aliviar estresse, estimular foco e reconectar mente e corpo
Estar hiperconectado se tornou uma condição cotidiana e perigosa. Notificações constantes, feeds infinitos e vídeos de poucos segundos têm aumentado a preocupação com os impactos do uso excessivo da tecnologia na saúde mental e física. Diversas pesquisas já apontam que o tempo prolongado diante das telas está associado a aumento da ansiedade, distúrbios do sono, cansaço visual, dores musculares e até sintomas depressivos. Em contrapartida, atividades manuais ressurgem como uma solução simples, acessível e eficaz para enfrentar os efeitos negativos da vida digital.
Segundo revisão publicada no PLOS Global Public Health, o uso abusivo das redes sociais aparece ao lado de vícios como o álcool e o tabaco como fator de risco para sintomas depressivos, ideação suicida e autolesões. Especialistas também apontam que o excesso de estímulos digitais impacta negativamente funções cognitivas essenciais.
Em entrevista ao portal VivaBem Uol, o psiquiatra Gabriel Okuda, do Hospital Israelita Albert Einstein, alerta que “essa hiperconectividade gera um excesso. Não conseguimos lidar com tanta informação ao mesmo tempo e prestar atenção em tudo. As pessoas consomem cada vez mais conteúdo em menos tempo. São coisas que não prendem tanto a atenção, vídeos curtos, pouco texto, bordões para aprender rápido”.
A consequência imediata desta sobrecarga é dispersão, vídeos curtos, linguagem simplificada e estímulos constantes que limitam o foco e a concentração. “O fato de passar horas consumindo conteúdos repetitivos, que não exigem muita atenção nem trazem aprendizados ou grandes desafios para o cérebro, pode até impactar o desenvolvimento cognitivo. E, quanto mais tempo no mundo digital, menor a dedicação a outras atividades, como praticar esportes, ter contato com a natureza, investir nos relacionamentos e no autocuidado”, completa o médico.
Neste cenário, atividades manuais têm sido usadas como uma alternativa terapêutica que ajuda a estimular o cérebro de forma profunda, favorecendo o foco, a paciência e a criatividade.
De acordo com estudo da Universidade Anglia Ruskin, no Reino Unido, envolver-se em atividades criativas está diretamente ligado ao aumento do bem-estar. A pesquisa indica que este tipo de ocupação pode diminuir os níveis de cortisol – o principal hormônio relacionado ao estresse. “Envolver-se com artesanato é acessível e econômico. Opções como tricô e desenho requerem poucas ferramentas e podem ser atividades envolventes e criativamente gratificantes”, afirma Helen Keys, psicóloga cognitiva e chefe da Escola de Psicologia e Ciências do Esporte da universidade britânica.
Para quem busca alternativas para reduzir o tempo de tela, atividades manuais são boas soluções. Desenho livre, aquarela, origami, cerâmica e crochê são opções que não exigem experiência prévia e grandes investimentos para começar. No crochê, por exemplo, basta ter uma agulha de crochê e alguns fios, sendo possível criar peças únicas, variadas e desconectar-se do mundo digital. A repetição dos pontos e o toque dos materiais ajudam a reequilibrar o corpo e a mente.
Além dos benefícios emocionais, as atividades manuais resgatam a relação com o tempo e com a materialidade das coisas. Em vez de consumir conteúdos prontos, o fazer manual exige participação ativa, coordenação e paciência, e pode ser integrado facilmente às mais diferentes rotinas, sem necessidade de grandes investimentos ou habilidades prévias.
Em comunidades terapêuticas e clínicas de reabilitação, o uso de trabalhos manuais é frequente como recurso complementar em tratamentos psicológicos e neurológicos. Isso porque o fazer manual também desperta sensações de autonomia que são importantes para a saúde mental.