Tomislav R. Femenick: A revolução sem ternura

No final dos anos cinquenta do século passado, o mundo vivia o período da guerra fria ao mesmo tempo em que as ideias liberais e democráticas afloravam no mundo ocidental. Na França, um referendo popular aprovou a Constituição da V República, logo revisada para permitir a independência das antigas colônias. Na Inglaterra também se iniciou uma política de descolonização. No inicio da década seguinte, Kennedy foi eleito presidente dos Estados Unidos e Kubitschek presidente do Brasil. Foi nesse clima de boa vontade, que eclodiu a revolução que derrubou o frágil e corrupto governo do ditador cubano Fulgencio Batista e levou o “comandante” Fidel Castro ao poder, em 1959.

A luta revolucionária começou sua vitória no verão de 1958, quando Fidel se firmou em Sierra Mestra, seu irmão Raul em Sierra Del Cristal e Che Guevara e Camilo Cienfuegos nas montanhas de Escambray. No dia primeiro de janeiro de 1959 Guevara e Cienfuegos ocuparam Havana. Fidel chegou à capital oito dias depois, quando formou um governo integrado por todos os que faziam oposição ao ditador Batista, assumindo o poder como um nacionalista, liberal e socialdemocrata. De sua plataforma constava a realização de eleições livres e a restauração da Constituição.

O famoso historiador comunista inglês Eric Hobsbawn, faz duas afirmações que devem ser levadas em conta. A vitória do exército rebelde foi genuinamente apoiada pela maioria dos cubanos como um momento de libertação e de infinitas promessas. No período de luta revolucionária, “nem Fidel Castro, nem qualquer de seus camaradas eram comunistas […] e o Partido Comunista Cubano era notadamente não simpático a Fidel”. Entretanto, logo após a tomada do poder os revoltosos deram mostra da sua radicalização, quando o processo revolucionário extrapolou para o fuzilamento dos seus inimigos (reais ou pretensos), que eram julgados sem defesa e sumariamente fuzilados. As cenas de fuzilamento, em pleno campo de esportes de Havana, eram transmitidas pela televisão. Calcula-se que 400.000 pessoas foram detidas como prisioneiros políticos. Só em dezembro de 1961 Fidel Castro se proclamou marxista-leninistas e afirmou o caráter socialista da revolução cubana.

Mas a revolução cubana também teve as suas vítimas internas. Vários destacados guerrilheiros acabaram presos, exilados ou morreram de forma enigmática. Aníbal Escalante (fundador do Partido Comunista de Cuba e integrante do governo) foi mandado para o exilo e, em um segundo julgamento, condenado a 15 anos de prisão. O comandante Abel Palomino passou 30 anos de sua vida na prisão de “La Cabana”. Outro comandante, Huber Matos, foi condenado a 20 anos de prisão. O ministro da Reforma Agrária, comandante Sorí-Marin, foi preso e fuzilado. Houve estranhos acidentes, como o misterioso desastre aéreo em que morreu Camilo Cienfuegos, comandante do Exército Rebelde.

Existe, ainda, a polêmica: Che Guevara foi ou não alijado do governo e traído por Fidel? Há evidências que sim e outras que não. O certo é que a presença de Guevara “bipolarizava”, dividia, a liderança carismática da ilha entre ele e Fidel. É certo, também, que as informações que foram dadas ao argentino sobre as condições reais da revolução boliviana foram superdimensionadas, o que o induziu ao erro, fazendo com que caísse numa armadilha que o levou à morte. Quem faz essas acusações é Dariel Alarcón Ramírez, o “comandante Benigno”, ex-chefe e instrutor dos latino-americanos que treinavam em Cuba, um dos cinco que sobreviveram à campanha do Che na Bolívia e exilado na França. O bizarro é que Guevara e Cienfuegos estão enterrados no panteão dos heróis da Revolução Cubana, na catedral de Havana, ao lado dos túmulos de Cristóvão Colombo (?) e de José Martí, este o herói máximo dos cubanos.

O regime de Fidel Castro fuzilou entre 15 mil e 17 mil pessoas, 10 mil só na década de 1960. Entre as últimas vítimas do “paredón” cubano estão Lorenzo Enrique Copeyo Castillo, Bárbaro Leodán Sevilla García e Jorge Luis Martínez Isaac, executados em 2 de abril de 2004.

Em uma entrevista, a filha de Fidel Castro, Alina Fernandez Revuelta, disse: “O grande problema deste país [Cuba] é que várias gerações embarcaram na conquista de um sonho, mas só alcançaram um pesadelo, e não querem reconhecê-lo”.

Tribuna do Norte. Natal, 03 dez. 2016

Tomislav R. Femenick – Mestre em economia e historiador