Thadeu Brandão – Crime de Sonegação Fiscal no Brasil

 

Quando falamos de crime no Brasil, em geral, tendemos a deixar de lado o crime de sonegação fiscal. Pensamos em assaltos, homicídios e estupros, que nos horrorizam e são manchetes dos principais periódicos do país. Mas, em termos de danos sociais ao país, a sonegação fiscal é um dos mais danosos crimes que podemos citar. Ao lado da corrupção e enquanto uma de suas teias, a sonegação ou “crime fiscal”, ou crime contra a ordem econômica é uma ilegalidade que está presente em nosso cotidiano de forma silenciosa.

A lei 8.137/1990 arrola as condutas da sonegação fiscal passíveis de punição no Brasil: omissão de renda, caixa dois, etc. Basicamente, não apenas empresas, mas indivíduos comuns sonegam ou contribuem para a sonegação quando, por exemplo, deixam de exigir cupom fiscal em uma compra. Basicamente, o sonegador pode oprimir um imposto a pagar (pagando-o apenas parcialmente), ou suprimi-lo (deixando de pagá-lo totalmente). Em termos legais, em geral, a cobrança e a punição do imposto tem um teor administrativo e não criminal. Por que será?

O crime de sonegação fiscal no Brasil é aquilo que o senso comum, sabiamente, denomina “crime de rico”. Dificilmente um sonegador é preso, embora o dano social e econômico de seu crime seja muito maior do que, por exemplo, um furto de um celular. Enquanto o autor do pequeno roubo será subtraído à prisão por cerca de até 5 anos, o sonegador, dividindo a sua dívida e a multa a ela anexada, jamais será criminalizado de fato. Recentemente, o país viu o Caso Daslú, um imponente crime de sonegação que envolveu cifras bilionárias, onde a proprietária foi presa por outros crimes arrolados e não por sonegação especificamente.

Como o processo é eminentemente administrativo, somente com a constatação da fraude fiscal é que se passa para o processo criminal. Em geral, isso termina não acontecendo à prescrição do processo após 5 anos. Bem diferente do modelo norte-americano onde o sistema pune os grandes sonegadores com prisão. Em muitos casos na luta contra máfias locais, o sistema consegue punir os mafiosos através do crime de sonegação, como no caso de Al Capone. Mais fácil lá, do que punir por contrabando, foi pegar o mafioso por sonegação. Aqui o caso é diametralmente o oposto.

No Brasil, pobre não tem como escapar do fisco, pois aqui o imposto é embutido. Daí que, em nossas representações sociais, pobre não pagaria imposto. Ledo engano. Percentualmente, quanto mais pobre, mais se paga imposto. Este, em seu caráter embutido, leva ao consumidor-contribuinte a não enxergar o imposto pago: afinal, o que os olhos não vêem… Isso nos leva a apontar um ponto central: a sonegação, como já dito anteriormente, é um crime típico das elites. Sua punição, portanto, é mais branda, quase nunca penalmente.

Uma curiosidade: em geral, os criminosos fiscais pertencem às redes sociais dos fiscais, o que dificulta ainda mais a punição. Têm-se, assim, mais um aspecto: à tolerância social liga-se também uma tolerância do Estado. Aponto aqui, especulativamente, um conceito explicador: temos uma “criminalidade tolerada”, ou seja, modalidades de condutas criminosas que são, em certa medida, toleradas social e politicamente em dado contexto social.

Sonegação fiscal no Brasil é, portanto, uma criminalidade tolerada, na medida em que, apesar de suas conseqüências danosas à sociedade, sua punição é bem mais aquém daquilo que poderia ser esperado. Crime de ricos num sistema tributário perverso que pune os mais pobres e abre possibilidade aos mais abonados de fugirem da malha fiscal.