Rogério Cruz – Impactos ambientais e fundiários da energia eólica no RN

A economia do estado do Rio Grande do Norte, segundo este jornal – “O Mossoroense”, de 23 de maio de 2016 -, lidera a produção brasileira de energia eólica. Isto é, há geração de um tipo de energia que é limpa e sustentável, oriunda da instalação de 102 parques eólicos. Essa base industrial instalada deve ampliar a oferta de energia, algo que é socialmente útil. Mais que um simples fato, esse setor é um fenômeno visto em nível nacional.

Mas, desde outro ponto de vista, distinto daquele ufanismo apresentado por diferentes setores da sociedade civil, no plano local, observa-se que, em face da emergência daquele setor há atores sociais que perdem e outros atores que ganham com esse tipo de implantação.

Assim, quem perde com essa constituição?

O surgimento da indústria eólica, na região do Mato Grande, por exemplo, tem apresentado a geração de ruídos – provocados pelos aerogeradores – que vem espantando abelhas nativas, que tradicionalmente produzem um tipo de mel de excelente qualidade, naquele território. Então, se esse produto nativo se constitui em fonte de renda para pequenos agricultores familiares, tal como ocorre no caso do município de Jandaíra, a fuga desses insetos, obviamente, vem provocando perdas para os produtores de mel. E, mais, perde também a sociedade que vê reduzida a oferta de mel orgânico. De modo marginal e adicional deve-se citar que esse setor sofre outro tipo de restrição, qual seja, uma seca de cinco anos consecutivos, que prejudica a produção de flores e/ou do mel. Portanto, um segmento que sofre uma dupla pressão, na atualidade, qual seja, do surgimento da energia eólica e, ainda, com a ocorrência da seca.

Em oposição, há segmentos que ganham com aquela instalação industrial, a exemplo daquele composto pelos proprietários de terras agrícolas. Vamos aos números? Notícia recente publicada na imprensa da capital do estado dá conta que, um projeto gerador de 30 megawatts, com 15 torres instaladas, que usa 600 hectares de área, paga uma renda estimada de R$ 319 mil/ano. Esse tipo de pagamento está, em geral, baseado em contratos – firmados entre empresas geradoras e proprietários – com duração média de 20 anos. Diante desses dados, pergunta-se: alguém duvida que a energia eólica é, na atualidade, uma excelente fonte geradora de renda para esses proprietários beneficiados com a instalação de equipamentos geradores de energia eólica?

Em que conjuntura econômica isso se deu? Inicialmente, o setor gerador de energia passou a ocupar terras que, até seu surgimento, estavam ociosas – isto é, desde a primeira metade dos anos 1980, devido a retração da produção algodoeira. Surgiu, pois, um contexto oposto, tendo em vista a geração de expectativas de ganhos para os proprietários de terras, diante daquela possibilidade de arrendá-las. E, na sequência, a partir do momento em que isto se concretizou, os proprietários de terras passaram a auferir renda.

Ademais, ao contrário do que havia na economia algodoeira, agora, os proprietários de terras não necessitam de nenhum tipo de gasto e/ou de investimento agrícola, para haver a possibilidade de se auferir renda, o que amplia ainda mais, em termos relativos os ganhos dos proprietários fundiários. E, a exemplo do que ocorreu recentemente com o caso dos proprietários de terras arrendadas para extração de petróleo na mesorregião oeste do estado, no caso da energia eólica, ampliou-se ainda mais o número de proprietários rurais beneficiados pela renda da terra – a partir de agora denominados de “rentistas”.

Em suma, a indústria eólica está em expansão no estado do RN. Pela sua natureza sustentável e produtora de energia limpa, além de socialmente útil, há de se consolidar por aqui, segundo apontam as atuais evidências disponíveis. Mas, vamos apenas fazer elogios sem ver os impactos socialmente negativos que ela pode gerar? Onde está o Estado regulador da atividade econômica que atua em busca do bem-estar social?

Por fim, indago aos meus netos – Beatriz, Maitê, João Vitor e Lucas -, a quem ofereço estas reflexões: o desenvolvimento do setor eólico, que vocês verão, no futuro, deverá gerar e distribuir riquezas, de modo minimamente equânime, no nível local/regional? Ou, irá apenas destruir setores já existentes, concentrar renda fundiária para uns poucos, e, ainda, contribuir para restrição de acesso à terra, porque cara e fortemente disputada para uso energético e/ou arrendamento vantajoso?

Rogério Cruz – Doutor em Economia (UNICAMP)/Professor da UFRN