Clauder Arcanjo: Pílulas para o Silêncio Parte CLVI

O retrato na parede não lembra as mulheres de Licânia. Não sei o motivo; suspeito que, para mim (ser-criança), as verdadeiras damas devem ter a tez de minha mãe.

Se Freud explica?! Pode ser, este austríaco foi um grande filho de uma mãe.

 

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Nos olhos, a nódoa de uma tristeza antiga. Daquela de tingir o olhar de um cinza tão indescritível que a cabeça queda, (res)sentida com tanta desventura.

 

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— Alto lá! — Anunciou-lhe o anjo.

— Arcanjo Gabriel, eu preciso entrar. Subi aos céus, na esperança de entrar e aqui ficar. Sofri muito na Terra, renunciando às ditas “tentações”. Nem sei como consegui. Nos últimos dias, ó Senhor!, estava quase caindo em tenta… — argumentou o cristão, os olhos rubros de desespero e fúria.

— Serenai! O mundo de Jeová está próximo… Calma! Pelo amor do Pai!… — Alegou o guardião das hostes celestiais, enquanto tentava identificar, no Livro de Deus, o destino daquela alma.

— Eu quero entrar. E vou fazer isto agora. Dá-me o que é meu, e lá vou eu! Saia do meio. Ora bolas! Se não… a minha vida não valeu a pena. E chega de intermediário! Faça-me o favor de convocar: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Fui claro? — Ordenou, enquanto o firmamento, entre aleluias, parava no Tempo.

 

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Quando punimos o próprio filho, por mais terrível que seja a sua falta, o penitenciado somos nós.

 

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Alegria é difícil. Felicidade, raridade. Vida feliz, quimera inalcançável.

Só os tristes sobrevivem aos desaforos do mundo. Salve, então, Sra. Melancolia!

Clauder Arcanjo

Clauder Arcanjo

Clauder Arcanjo é escritor, membro da Academia de Letras do Brasil. Autor das obras Licânia, Novenário de espinhos, Uma garça no asfalto, Cambono, O Fantasma de Licânia, entre outras.