Homero Costa: A AMAZÔNIA E A SOBERANIA NACIONAL

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Num momento graves ameaças à democracia, com o avanço dos retrocessos é fundamental unir-se em defesa do que resta da democracia e em defesa da soberania nacional. A questão é: Como viabilizar? Será possível, hoje, a construção de uma Frente Ampla com tais propósitos?

Naquele momento, ela se formou com o objetivo de defender a democracia e a manutenção dos direitos que estavam sendo violados no governo golpista de Michel Temer. Em seu manifesto afirmava-se que “a violência, o ódio e a intolerância disseminados nas redes sociais, incitados por estratégias de comunicação da mídia tradicional, se arrogam a pretensão de pautar a agenda política nacional, tratando o Estado Democrático de Direito como se fosse apenas um empecilho anacrônico em seu caminho”.

Quando foi proposta e constituída, a Frente não visava apenas às eleições, mas “estimular um amplo debate nacional contra o avanço do ódio, da intolerância e da violência”. Como ficou amplamente demonstrado, antes, durante e depois das eleições de outubro de 2018, não conseguiu e nem, no segundo turno, formar uma ampla aliança dos partidos de oposição e de esquerda para enfrentar, com êxito, a extremadireita.

A lição que ficou é que, na prática, a Frente não passou de intenções, mas se atualiza num momento em que há a necessidade de se enfrentar uma agenda antipopular e antinacional, de retirada de direitos, de desmonte das políticas públicas, dos atentados à soberania nacional como tem sido demonstrado pelo conjunto das ações (e intenções) do atual governo.

No manifesto da Frente de 2018 afirmava-se que “A democracia não pode conviver com milícias armadas, ameaças de morte, atentados ou assassinatos” e que era “hora de dar um basta à violência, atuando em todas as instâncias possíveis, para alcançar e punir os responsáveis por disseminar e incitar o ódio e a intolerância”.

Palavras e intenções que se mantém. Quanto à soberania nacional, na Constituição promulgada em cinco de outubro de 1988, Dos Princípios fundamentais, Art. 1º diz: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: I – a soberania; II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V – o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

Assim, a soberania nacional é o primeiro dos fundamentos da República e nela o Estado deve ser soberano tanto no exercício do poder no âmbito do território nacional, como também tem o dever de elaborar e aplicar leis para garanti-la, e, importante ressaltar, sem se sujeitar a interesses estrangeiros.

Nesse sentido, o dever constitucional do chefe de Estado, no caso, o presidente da República, é o da defesa da soberania nacional, assim como a proteção dos interesses do país no exterior.

Colocado nestes termos, o que dizer, hoje, a respeito da Amazônia? Sua soberania está resguardada? De um lado, há de se considerar os interesses internacionais para perceber o que está por trás dos discursos de proteção ambiental e o fato de que também não interessa a todos, inclusive companhias estrangeiras, a sua devastação,
pelas óbvias implicações que terá para o planeta, como fonte importante de oxigênio e biodiversidade.

Há de se considerar também um mercado sensível a questões ambientais que pode trazer conseqüências para importações de produtos brasileiros, como foi anunciado no dia 27 de agosto, com 18 marcas de roupas e calçados internacionais, entre outras, a Timberland, Kipling, Vans e The North Face, que suspenderam compras de couro do Brasil por causa das queimadas na Amazônia, conforme informação do Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil (CICB), que representa as empresas produtoras de couro em documento enviado ao ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.

A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, que é “um movimento multissetorial, composto por entidades que lideram o agronegócio no Brasil, as principais organizações civis da área de meio ambiente e clima, representantes de peso do meio acadêmico, associações setoriais e companhias líderes nas áreas de madeira, cosméticos, siderurgia, papel e celulose, entre outras” (http://www.coalizaobr.com.br/home/index.php/sobre-a-coalizao/quem-somos.) e reúne mais de 200 representantes, preocupado com a escalada do desmatamento e das atividades ilegais na Amazônia (segundo a entidade, mais de 90% do corte da floresta é ilegal) entregou, no dia 29 de agosto de 2019, um manifesto ao presidente da República, pedindo que retome o controle do desmatamento para garantir que o Brasil possa ser um ‘líder agro ambiental’.

No artigo A grande queima, publicado no dia 1 de setembro de 2019 no jornal Folha de S. Paulo, Janio de Freitas afirma que “O fogaréu amazônico lançou a ira da opinião mundial contra Bolsonaro e, por tabela, o desprezo pelo país passivo diante de sua tragédia. Mas, para Bolsonaro, todo o fogo é bem-vindo (…). O governo, por meio do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, cortou 30% da verba orçamentária para prevenção e combate a queimadas em florestas. O resultado dessas políticas antiambientais, antiamazônicas e anti-indígenas está visível não só nas chamas e na fumaça”. E continua “Bolsonaro já se dissera favorável à abertura da Amazônia para empresas norte-americanas de exploração mineral. Especificou bem: não empresas brasileiras, muito menos em geral, mas “americanas”.

A atual crise, de repercussões internacionais, foi deflagrada por atitudes e palavras sobre o meio ambiente, do presidente e do ministro do Meio Ambiente. O presidente disse que o Fundo Amazônia, financiado por Alemanha e Noruega, financiava ONGs – organizações não-governamentais – que estariam a serviço de uma grande conspiração da esquerda internacional contra o Brasil. Uma das conseqüências dessa fala foi à suspensão por parte da Alemanha de apoio financeiro dado a projetos de conservação florestal na Amazônia de 35 milhões de euros (cerca de 156 milhões de reais).

O presidente ainda chamou mentirosos os números do INPE que mostraram um avanço significativo do desmatamento na Amazônia no mês de julho, e o crescimento do desmatamento e ainda acusou a direção do órgão de estar “a serviço de alguma ONG” (pouco depois, o diretor do INPE foi afastado do cargo) e também acusou as ONGs de causarem os incêndios “para chamar a atenção para a minha pessoa”.

O fato é que, desde a criação do Fundo Amazônia, em 2008, o desmatamento estava recuando de forma considerável, mas sob o novo governo, segundo dados do INPE, voltou acrescer.
Como disse o jornal o Estado de S. Paulo em editorial do dia 25 de agosto de 2019 (A defesa da soberania nacional): “o estrago à imagem do Brasil já está feito – e é imenso. Jair Bolsonaro, em apenas oito meses de governo, conseguiu arruinar a reputação do País em uma das poucas áreas nas quais se destacava de maneira razoavelmente positiva graças aos esforços na preservação das florestas nativas. (…) Se o governo realmente estivesse preocupado com a defesa da soberania nacional, estaria empenhado em esclarecer a opinião pública internacional sobre a verdadeira situação na Amazônia e o que está sendo feito para enfrentar o problema em suas reais dimensões. Ao preferir ofender a inteligência de todo o mundo civilizado, o governo Bolsonaro apenas desmoraliza o Brasil”.

Hoje, trata-se de salvar a Amazônia, não apenas das queimadas e desmatamentos, mas também da cobiça internacional, ter e preservar, de fato, segundo os termos da Constituição, a efetiva e desejada soberania nacional.